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Diretoria da Corregedoria Geral da Justiça

Despachos/Pareceres/Decisões 90000013/2016


Acórdão DJ nº 9000001-36.2015.8.26.0443 - Apelação Cível
: 11/11/2016

 

 

 

Registro: 2016.0000797100

 

 

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 9000001-36.2015.8.26.0443, da Comarca de Piedade, em que são partes é apelante MEIRE OLIVEIRA LOPES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PIEDADE.

 

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso, com observação, v.u. Vencido, em sede de preliminar, o Desembargador Ricardo Dip, que declarará voto.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

 

 

São Paulo, 18 de outubro de 2016.

 

 

 

PEREIRA CALÇAS

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Assinatura Eletrônica


 

 

Apelação9000001-36.2015.8.26.0443

Apelante: Meire Oliveira Lopes
Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Piedade

Voto n.º 29.541

 

REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de arrematação – Cancelamento direto de penhoras estranhas à do processo onde ocorrida a alienação judicial – Desnecessidade – Cancelamento indireto oriundo do pretendido registro – Indisponibilidades legais (art. 53, § 1.º, da Lei n.º 8.212/1991) desprovidas de força para obstaculizar a alienação forçada do bem imóvel e seu respectivo registro – Retificação prévia prescindível – Princípio da cindibilidade – Exigências afastadas – Dúvida improcedente – Recurso procedente, com observação.

 

 

Irresignada com r. sentença que confirmou o juízo negativo de qualificação registral[1], a interessada interpôs apelação, em cujo corpo argumenta que a inscrição da carta de arrematação independe do cancelamento direto das penhoras especificadas pela Registradora e da prévia retificação exigida[2].

Com o recebimento do recurso[3], os autos foram enviados à E. CGJ[4] e, depois – já com o parecer da Procuradoria Geral da Justiça pelo desprovimento da apelação[5], posteriormente reiterado[6] –, ao C. CSM[7].

É o relatório.

A interessada, irresignada com o juízo negativo de qualificação registral, suscitou dúvida inversa[8], criação pretoriana então historicamente admitida por este C. CSM[9] e regrada pelas NSCGJ[10]: ou seja, ao invés de requerer a suscitação de dúvida à Registradora, dirigiu seu inconformismo diretamente ao Juiz Corregedor Permanente.

Ao tomar conhecimento da dúvida inversa, a Oficial prenotou o título, procedeu nos termos das alíneas b e c do item 41 das NSCGJ e, ato contínuo, apresentou suas razões para recusar a inscrição da carta de arrematação, que afirmou depender do cancelamento (direto) das penhoras registradas na mat. n.º 1.960 do RI de Piedade e da prévia retificação registral, à vista da ordem de destacamento contemplada no título.[11]

A dúvida inversa, apesar do vocábulo empregado na decisão questionada, foi julgada procedente, e não improcedente, pois confirmou o questionado juízo negativo de qualificação registral.[12] Feita, no entanto, essa pontual ressalva, a r. sentença impugnada, respeitado o entendimento nela expresso, comporta reforma.

O interessado/recorrente pretende o registro da carta de arrematação expedida pelo Juízo da 1.ª Vara Cível da Comarca de Piedade.[13] De acordo com o título, arrematou-se “a parte ideal do imóvel objeto da matrícula 1960 do Cartório de Registro de Imóveis de Piedade, correspondente a 20 (vinte) alqueires, ou seja, 48,40 ha., a ser destacado de uma área de 100 (cem) alqueires, situado à margem do Ribeirão Travessãozinho, no Bairro José Bento, município de Tapiraí-SP. ...”[14]

A origem judicial do título não torna prescindível, é certo, a qualificação registral: a prévia conferência destinada ao exame do preenchimento das formalidades legais atreladas ao ato pretendido é indispensável.[15] De toda forma, no caso vertente, as exigências opostas ao registro não merecem prevalecer.

O C. CSM, em sua última composição, no biênio 2014-2015, retomou sua tradicional posição[16] e, assim, reafirmou que a arrematação, nada obstante forma de alienação forçada, é modo derivado de aquisição da propriedade[17], motivo pelo qual a carta que a documenta se submete a ampla qualificação registral, sujeitando-se aos princípios registrais que a orientam, em sua plenitude.

A propósito, do v. acórdão proferido na Apelação n.º 9000002-19.2013.8.26.0531, rel. Des. Elliot Akel, j. 2.9.2014, que revigorou a anterior compreensão deste C. CSM, extraio as seguintes conclusões, as quais acedo:

...  arrematação e adjudicação são negócios jurídicos entre o Estado e os adquirentes. O primeiro detém o poder de dispor e aceita a declaração de vontade dos adquirentes, não se podendo dizer, só por isso, que não houve relação causal entre a propriedade adquirida e a situação anterior da coisa.

Em outras palavras: nos casos de alienação forçada não deixa de haver vínculo entre a situação anterior da coisa e a propriedade adquirida, com a diferença que, nesses casos de transferência coativa, o ato figura mais complexo, justamente diante da participação do Estado.

Contudo, o acesso registral da carta de arrematação independe do prévio cancelamento (direto) das penhoras referidas pela Oficial, inscritas na mat. n.º 1.960 do RI de Piedade[18], estranhas então à constrição vinculada à alienação judicial de que ora se trata.

A jurisprudência administrativa do C. CSM, forte na doutrina de Afrânio de Carvalho[19], sedimentou posição no sentido de que duas são as espécies de cancelamento dos registros (em sentido lato): o direto, dependente de assento negativo, efetuado mediante averbação, e o indireto, decorrente da repercussão de inscrições subsequentes (como, por exemplo, as da arrematação e adjudicação) sobre as anteriores.[20]

Oportuno, a respeito do tema, transcrever trechos do julgamento da Apelação Cível n.º 13.838-0/4, rel. Des. Dínio de Santis Garcia, ocorrido em 24.2.1992:

... o registro de arrematação não reclama o cancelamento direto e autônomo de registro das constrições precedentes, porque ele se afeta negativamente pela inscrição mais nova. Isso se dá porque a arrematação tem força extintiva das onerações pessoais e até mesmo das reais (cfr. Artigo 251 – II, Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973; Afrânio de Carvalho, op. cit., pág. 83), e de extinção do direito é que deriva a admissão de cancelamento do registro que lhe corresponda (RIFA SOLER, “La anotaction preventiva de embargo, 1983, págs. 510 ss.). O vínculo da penhora traslada-se para o preço da aquisição, sobre o qual concorrem os credores (LOPES DA COSTA, com apoio em DIDIMODA VEIGA e CARVALHO SANTOS, “Direito Processual Civil Brasileiro, 1947, IV, pág. 169).

Observe-se, por fim, que, no cancelamento indireto, é despicienda, em regra, a elaboração de assento negativo, salvo quanto à hipoteca, em vista da necessidade de qualificar-se pelo registrador a ocorrência que não é automática – da causa extintiva segundo prescreve o artigo 251 – II, Lei n.º 6.015, citada. (grifei)

A E. CGJ, nessa linha, subsidiada pelos precedentes do C. CSM, consolidou o entendimento de ser indireto o cancelamento de penhoras, arrestos e sequestros em função do registro de arrematação ou adjudicação, ou seja, o cancelamento direto não é automático, não deriva necessariamente da inscrição da arrematação, mas é prescindível, malgrado possível, se por ordem expressa do Juízo que determinou a constrição judicial.[21]

A resposta à consulta formulada no Protocolado CG n.º 11.394/2006, documentada no parecer n.º 238/06-E, de autoria do Juiz Assessor da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra e do hoje Des. Vicente de Abreu Amadei, aprovado, em 26.6.2006, pelo Des. Gilberto Passos de Freitas, é esclarecedora:

... no tocante ao registro da arrematação ou adjudicação o que se verifica é a sua 'ressonância' sobre o registro das constrições anteriores (penhoras, arrestos ou sequestros), para a retirada da eficácia destas em relação ao credor que arremata ou adjudica o imóvel, configurador do aludido 'cancelamento indireto'. Não há, nesses termos, 'cancelamento direto' das constrições anteriores, dependente de assento negativo, razão pela qual inviável se mostra falar em automático cancelamento do registro daquelas com base tão-só no registro da arrematação ou adjudicação, a partir de requerimento do interessado.

É certo, porém, que tal cancelamento direto das penhoras antecedentes, embora despiciendo, como visto, pode, efetivamente, ser obtido pelo interessado, a fim de evitar dificuldade na leitura e no entendimento, por parte de leigos, da informação gerada pela matrícula, como mencionado pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente (fls. 77). Mas para tanto, dever-se-á obter ordem judicial, expedida pelo juízo da execução que determinou a penhora.

Anote-se que a ordem judicial em questão se mostra imprescindível para o cancelamento direto das penhoras, já que estas foram determinadas pelo juiz da execução, no exercício regular da jurisdição, não cabendo sequer ao Juiz Corregedor Permanente ou a esta Corregedoria Geral da Justiça, no exercício de atividade meramente administrativa, deliberar a respeito. Como se sabe, no sistema jurídico-constitucional brasileiro, admite-se que os atos dos demais Poderes do Estado – legislativos e administrativos – sejam revistos pelos juízes no exercício da jurisdição, mas o contrário, ou seja, a revisão dos atos jurisdicionais dos juízes pelas autoridades legislativas ou administrativas, é absolutamente inadmissível (Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, vo. I, p. 310).

...

Assim, sem expressa ordem judicial oriunda do juízo que determinou a constrição, não se pode admitir o cancelamento de penhoras, arrestos e sequestros antecedentes, como decorrência automática do registro da arrematação ou adjudicação dos bens constritos havida em execução judicial. (grifei)

Tal compreensão foi mantida pelo C. CSM e pela E. CGJ mesmo no período durante o qual subsistiu a intelecção no sentido de ser originária a natureza jurídica da aquisição de imóvel mediante arrematação judicial.[22]

Destarte, a carta de arrematação não é documento hábil para, instruindo eventual requerimento da recorrente, autorizar, com amparo no art. 250, III, da Lei n.º 6.015/1973, os cancelamentos (diretos) das penhoras indicadas pela Oficial; tampouco basta, portanto, e para tanto, o registro do titulo judicial aquisitivo da propriedade, que, porém, independe do prévio cancelamento direto dos registros das constrições judiciais, desnecessário para fins da inscrição visada.

Por sua vez, a indisponibilidade decorrente dessas penhoras, todas efetivadas em execuções fiscais[23], também não é óbice ao registro da carta de arrematação. Aliás, conforme o item 405 do Cap. XX das NSCGJ, “as indisponibilidades averbadas nos termos do Provimento CG. 13/2012, e na forma do § 1º, do art. 53, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a alienação, oneração e constrição judiciais do imóvel.” (grifei)

Ademais, de acordo com entendimento assente no C. CSM, essas indisponibilidades dizem respeito exclusivamente à venda voluntária do bem imóvel pelo devedor. Não impedem que se o penhore, que se o leve à hasta, nem que se registre a alienação forçada.[24] No mesmo sentido, há precedentes das Câmaras de Direito Privado e de Direito Público desta E. Corte.[25] Não bastasse, essa é a posição retirada de julgamentos proferidos pelo C. STJ.[26]

Com relação ao art. 16, caput, do Provimento n.º 39/2014 da E. Corregedoria Nacional de Justiça[27], constata-se, à luz de seu trecho inicial, que as indisponibilidades averbadas nos termos desse ato normativo e as decorrentes do art. 53, § 1.º, da Lei n.º 8.212/1991 não impedem a alienação judicial do bem imóvel, com respectivo registro. Esta, frise-se, a regra.

O dispositivo estabelece, todavia, não se ignora, as condicionantes – que ora interessam – de que a alienação tenha emanado do juízo que decretou a indisponibilidade ou de que esteja “consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução”.

Quanto a essa exigência, é de se amainar, mormente à vista dos precedentes mencionados, a necessidade de que a carta de arrematação contenha expressa menção sobre a prevalência da venda judicial. Ora, a preferência da alienação judicial em relação a eventuais restrições oriundas de outros Juízos ou de autoridade administrativa é ínsita a esse título judicial, cuja finalidade precípua é viabilizar o registro da venda forçada.

Seria de todo incongruente, realmente, que o Juízo onde ocorrida a hasta pública expedisse carta de arrematação, se não fosse para que o arrematante pudesse levá-la a efetivo registro. Quando da ordem de expedição da carta de arrematação, o Juízo está afirmando, porque consequência imanente ao ato, que o respectivo registro há de ser efetuado, ainda que as indisponibilidades inscritas resultem de ordens de outros Juízos ou de autoridade administrativa.

Note-se que o registro não trará, em tese, prejuízo àquele cuja demanda tenha ensejado a indisponibilidade. O crédito que possui sub-roga-se no preço da arrematação, sem alteração alguma na ordem de preferência. Nem mesmo se olvide que o destinatário da ordem judicial de indisponibilidade é o próprio devedor. A ordem presta-se a obstar que ele, sponte propria, por alienação entre particulares, desfaça-se de seu patrimônio, furtando-se ao pagamento da dívida. Entretanto, insista-se, a indisponibilidade não impede a venda judicial do bem.

Sob outro prisma, in concreto, não se está diante de uma alienação voluntária de frações ideais com localização e metragem certas ou da formação de condomínio voluntário, que implique fraude ou qualquer hipótese de descumprimento da legislação de parcelamento do solo urbano, de condomínio edilícios e do Estatuto da Terra. Vale dizer, não se encontra configurado o óbice expresso no item 171 do Cap. XX das NSCGJ.

Nessa trilha, a registrabilidade do título judicial na mat. n.º 1.960 do RI de Piedade não está comprometida. Malgrado a retificação do registro e a especialização da fração ideal arrematada, atualmente registrada em nome de Tello e Cia. Ltda., condicionem seu futuro e eventual destacamento da gleba maior identificada na matrícula, a qualificação do título, sob o enfoque do princípio da cindibilidade, conduz à inscrição pretendida.

Agora, o exame da mat. n.º 1.960 do RI de Piedade sugere o parcelamento irregular do solo, ocorrida enquanto Oficial Paulo Gomes Abreu, que se aposentou compulsoriamente em maio de 1992[28]; evidencia, por exemplo, que a fração ideal equivalente a 200 alqueires, pertencente a Miguel Munhoz Bonilha, foi, no plano fático, destacada da área maior, que corresponde a 300 alqueires, e voluntariamente alienada como se unidade autônoma fosse[29].

Enfim, há elementos concretos indicativos de ilícitos desmembramentos. Convém, nesse contexto, que o MM Juiz Corregedor Permanente, em expediente próprio, cuja abertura deve informar à E. CGJ, apure os fatos e, inclusive, resolva sobre a pertinência do bloqueio cautelar da matrícula, com vistas ao seu saneamento, dando ciência, no mais, a todos os interessados.

 

Isto posto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso, com observação, para julgar a dúvida improcedente e, dessa forma, determinar o registro da carta de arrematação na mat. n.º 1.960 do RI de Piedade.

PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Assinatura Eletrônica

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação 9000001-36.2015.8.26.0443 - SEMA

Procedência:Piedade

Apelantes:Meire Oliveira Lopes

Apelado:Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da comarca

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VISTO (Voto n. 42.782):

 

1.Na esfera preliminar, meu voto extingue o processo sem resolução de mérito.

 

Trata-se aqui do que se habituou designar “dúvida inversa”, a que, contra legem, é suscitada pelo interessado, diretamente, ao juízo corregedor.

 

Cuida-se de prática, com efeito, que não está prevista em lei, razão bastante para não se admitir de fato, por ofensa à exigência constitucional do devido processo (inc. LIV do art. 5º da Constituição federal de 1988).

 

Não autoriza a lei uma livre eleição de forma inaugural e de rito de nenhum processo administrativo, e, na espécie, a “dúvida inversa” não se afeiçoa ao previsto expressamente na Lei n. 6.015/1973 (de 31-12, arts. 198 et sqq.).

 

Se o que basta não bastara, cabe considerar que ao longo de anos, essa “dúvida inversa” se tem configurado por um risco para a segurança dos serviços e até para as expectativas dos interessados. É que, não rara vez (e o caso destes autos é só mais um exemplo dentre tantos), o pleito não atende a tão exigíveis preceitos de processo registral (assim, o primeiro deles, a existência de prenotação válida e eficaz) que está mesmo de logo fadado a frustrar-se, levando a delongas que o humilde respeito ao iter imposto em lei teria evitado.

 

Meu voto preliminar, pois, julga extinta a dúvida, sem apreciação de seu mérito, prejudicado o exame do recurso de apelação.

 

2.Superada a preliminar, voto pelo provimento do recurso.

 

Em que pese a precedentes deste Conselho e da eg. Corregedoria Geral da Justiça, o registro stricto sensu de arrematação em execução forçada não supõe nem implica o cancelamento (mesmo indireto) de outras penhoras que existam sobre o bem arrematado.

 

No direito vigente, o cancelamento direto da penhora tem de fazer-se em cumprimento a decisão judicial transitada em julgado; ou a requerimento unânime das partes que tenham participado do ato registrado; ou a requerimento do interessado, instruído com documento hábil (incs. I-III do art. 250 da Lei n. 6.015/1973); ou ainda, em juízo, por iniciativa de terceiro prejudicado (eodem, art. 253).

 

Como, in casu, não se dão aquelas duas primeiras hipóteses, nem essa última, o cancelamento direto só se poderia dar se houvesse documento hábil a tanto, apresentado por requerimento do interessado (Lei de Registros, art. 250, III). Esse documento não é outro, senão ordem da própria autoridade judicial que mandara proceder à constrição, uma vez que –passe o truísmo– um juiz (ex hypothesi, o que fez passar a carta de arrematação) não pode desconstituir ato de magistrado de mesmo grau.

 

Tampouco se pode dizer que a carta de arrematação (se não é documento hábil na forma do dito inc. III do art. 250 e, pois, não permite cancelamento direto) pode servir para o cancelamento indireto de outras penhoras.

 

 Ao contrário do que se passa, e. g., com uma compra e venda que suceda a outra in tabula (caso em que o poder de dispor do dono anterior se esgota por inteiro), não é viável afirmar, peremptoriamente, que a arrematação esvazie toda a eficácia de outras constrições: por exemplo, ainda resta ao menos a eficácia decorrente do inc. V do art. 889 da nova Lei Adjetiva, suficiente para justificar o desfazimento da hasta, caso não se tenha guardado a preferência oriunda de averbação anterior.

 

Ademais, tanto não há cogitar de cancelamento indireto, que, a despeito do registro stricto sensu da arrematação, as penhoras de que decorram indisponibilidades (di-lo a jurisprudência deste Conselho, aplicando o art. 252 da Lei n. 6.015/1973) continuam a produzir efeitos e a impedir alienações voluntárias subsequentes, até que o interessado consiga, no juízo competente, o cancelamento direto.

 

Feita essa ressalva, bem lançado está o voto da relatoria, que corretamente dispensa o cancelamento para o registro stricto sensu da alienação forçada – inscrição à qual tampouco são óbices o fato de tratar-se de aquisição de fração ideal e a necessidade de retificação futura, quando se pretender desmembramento.

 

DO EXPOSTO, por meu voto preliminar, julgava extinto o processo, sem resolução de mérito, prejudicado o recurso de apelação de Meire Oliveira Lopes.

 

No mérito, provejo o recurso, para o fim de que se registre a aquisição objeto, como rogado.

 

É como voto.

 

 

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público

 

 

[1] Fls. 58-61.

[2] Fls. 68-79.

[3] Fls. 80.

[4] Fls 84.

[5] Fls. 86-90.

[6] Fls. 99.

[7] Fls. 91.

[8] Fls. 2-9.

[9] Apelação Cível n.º 23.623-0/1, rel. Des. Antônio Carlos Alves Braga, j. 20.2.1995; Apelação Cível n.º 76.030-0/8, rel. Des. Luís de Macedo, j. 8.3.2001; e Apelação Cível n.º 990.10.261.081-0, rel. Des. Munhoz Soares, j. 14.9.2010.

[10] Item 41.1. do Cap. XX.

[11] Fls. 41-49.

[12] Fls. 58-61. Cf. Apelação Cível n.º 990.10.261.081-0, rel. Des. Munhoz Soares, j. 14.9.2010: “a nomenclatura utilizada pelo art. 203 da Lei de Registros Públicos não faz distinção entre a dúvida comum e a inversa, razão pela qual na verdade a dúvida foi julgada procedente, a despeito do erro material contido na sentença.”

[13] Fls. 12-25.

[14] Fls. 13-14.

[15] Nessa linha, apenas a título de exemplo, Apelação Cível n.º 39.487-0/1, rel. Des. Márcio Martins Bonilha, j. 31.07.1997, e Apelação Cível n.º 404-6/6, rel. Des. José Mário Antonio Cardinale, j. 08.09.2005.

[16] Apelação Cível n.º 20.745-0/6, rel. Des. Antônio Alves Braga, j. 11.5.1995; Apelação Cível n.º 322-6/1, rel. Des. José Mário Antonio Cardinale, j. 14.4.2005; Apelação Cível n.º 1.230-6/9, rel. Des. Munhoz Soares, j. 16.3.2010; e Apelação Cível n.º 0035805-59.2010.8.26.0100, rel. Des. Maurício Vidigal, j. 8.9.2011.

[17] Apelação Cível n.º 9000002-19.2013.8.26.0531, rel. Des. Elliot Akel, j. 2.9.2014.

[18] Fls. 39 e 41-48.

[19] Registro de Imóveis. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 184.

[20] Apelação Cível n.º 13.838-0/4, rel. Des. Dínio de Santis Garcia, j. 24.2.1992; e Apelação Cível n.º 15.296-0/4, rel. Des. Dínio de Santis Garcia, j. 3.8.1992.

[21] Parecer n.º 238/06-E, do Juiz Assessor da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra e do hoje Des. Vicente de Abreu Amadei, aprovado, pelo Des. Gilberto Passos de Freitas, em 26.6.2006; Parecer n.º 173/07-E, do Juiz Assessor da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra, aprovado, pelo Des. Gilberto Passos de Freitas, em 26.6.2007; e Parecer n.º 74/2010-E, do Juiz Assessor da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra, aprovado pelo Des. Antonio Carlos Munhoz Soares, em 30.3.2010. 

[22] Apelação Cível n.º 0003288-37.2009.8.26.0358, rel. Des. Renato Nalini, j. 19.7.2012; e parecer n.º 529/2013-E, de autoria do Juiz Assessor da Corregedoria Luciano Gonçalves Paes Leme, aprovado, em 6.12.2013, pelo Des. Renato Nalini.

[23] Art. 53, § 1.º, da Lei n.º 8.212/1991.

[24] Apelação Cível n.º 0004717-40.2010.8.26.0411, rel. Des. Renato Nalini,  j. 27.8.2012; Apelação Cível n.º 3000029-33.2013.8.26.0296, rel. Des. Elliot Akel, j. 5.5.2014; e Apelação Cível n.º 1077741-71.2015.8.26.0100, rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, j. 16.6.2016.

[25] AI n.º 2200292-45.2015.8.26.0000, rel. Des. Jacob Valente, j. 30.11.2015; e AI n.º 2006767-64.2016.8.26.0000, rel. Des. Ponte Neto, j. 25.5.16.

[26] REsp. n.º 512.398/SP, rel. Min. Felix Fischer, j. 17.2.2004; e AgRg na MC n.º 16.022/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 27.4.2010.

[27] Art. 16. As indisponibilidades averbadas nos termos deste Provimento e as decorrentes do § 1.º, do art. 53, da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a inscrição de constrições judiciais, assim como não impedem o registro da alienação judicial do imóvel desde que a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade, ou que distribuído o inquérito civil público e a posterior ação desse decorrente, ou que consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução. (grifei)

[28] Informação prestada pela DICOGE.

[29] Fls. 34-38, av. 1 da mat. 1.960 do RI de Piedade.



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