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Diretoria da Corregedoria Geral da Justiça

Despachos/Pareceres/Decisões 19266520/2016


Acórdão - DJ nº 0001926-65.2015.8.26.0236 - Apelação Cível
: 16/08/2016

 

 

 

Registro: 2016.0000572870

 

                                                                    

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 0001926-65.2015.8.26.0236, da Comarca de Ibitinga, em que são partes é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado JARDIM EUROPA CONDOMÍNIOS RESIDENCIAIS LTDA.

 

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Julgaram procedente a dúvida e deram provimento ao recurso, v.u.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

 

 

São Paulo, 4 de agosto de 2016.

 

 

 

PEREIRA CALÇAS

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Assinatura Eletrônica


 

 

Apelação0001926-65.2015.8.26.0236

Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo
Apelado: Jardim Europa Condomínios Residenciais Ltda

Voto nº 29.489

 

 

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida registral – Loteamento – Processo penal em curso contra ex-proprietários e ex-sócios recentes da loteadora, acusados de prática de inúmeros crimes contra a Administração Pública (art. 333 c/c o art. 69 do CP) – Acusados que cederam as quotas sociais às suas mulheres – Incidência do art. 18, § 2.º, da Lei nº 6.766/1979 – Inviabilidade do registro – Insuficiência da presunção constitucional de não culpabilidade para, neste procedimento, excluir o obstáculo levantado à inscrição – Descabimento da invocação da Lei nº 13.097/2015 para fins do registro requerido – Dúvida julgada procedente – Recurso provido.

 

 

 

O apelante, uma vez irresignado com o julgamento improcedente da dúvida (fls. 471/476), interpôs apelação, quando alegou o acerto do juízo negativo de qualificação registral, à vista dos processos pelos quais respondem Antonio Carlos Chapela Nores e Pedro Augusto do Nascimento Júnior, ex-sócios da loteadora e ex-proprietários do bem imóvel objeto do loteamento idealizado. Realça, em particular, que são acusados de crimes contra Administração Pública e, além disso, sustenta a inaplicabilidade da Lei nº 13.097/2015. Enfim, pretende a reforma da r. sentença, para obstar o registro do loteamento (fls. 482/492).

Após o recebimento do recurso no duplo efeito (fls. 494), a apelada, com sua resposta recursal, ao reiterar sua impugnação anterior, aguarda confirmação da decisão questionada, porque ausente o risco de prejuízo aos futuros adquirentes dos lotes: invocou a Lei nº 13.097/2015, com a qual o art. 18 da Lei nº 6.766/1979 deve harmonizar-se, a teoria do diálogo das fontes, o novo princípio da concentração da matrícula e o patrimônio declarado por Antonio Carlos Chapela Nores e Pedro Augusto do Nascimento Júnior (fls. 497/517).

Encaminhados os autos à E. CGJ, a Procuradoria Geral de Justiça propôs o desprovimento do recurso (fls. 525/528). Ato contínuo, considerando que a inscrição do loteamento envolve discussão sobre registro em sentido estrito, os autos foram enviados ao C. CSM (fls. 534).

É o relatório.

Ao recusar o registro do loteamento intencionado pela apelada Jardim Europa Condomínios Residenciais Ltda., o Oficial se escorou, precipuamente, no art. 18, III, c, e § 2º, da Lei nº 6.766/1979, em atenção à notícia de processos penais contra Antonio Carlos Chapela Nores e Pedro Augusto do Nascimento Júnior (fls. 329).

Ambos foram coproprietários do bem imóvel objeto do loteamento idealizado, descrito na mat. nº 7.148 do RI de Ibitinga, até meados de 2012, quando, em conjunto com suas esposas, com Vladimir Coleone e Cleide da Costa Coleone, alienaram-no à loteadora, apelada (fls. 6/9 e 22/23), de cujo quadro social já participaram, cedendo, depois, suas quotas, conforme admitiram (fls. 338), às suas mulheres, Maria José de Oliveira Chapela Nores e Renata Christina D'Angelo do Nascimento, que, atualmente, são as sócias, ao lado de Vladimir Coleone (fls. 10/20).

As ações penais promovidas contra Antonio Carlos Chapela Nores e Pedro Augusto do Nascimento Júnior versam sobre corrupção ativa, praticada em dez oportunidades, em concurso material, vale dizer, eles são acusados de cometimento de inúmeros crimes contra a Administração Pública (fls. 455/456). E isso, envolvendo recentes ex-proprietários do imóvel a ser loteado (cf. art. 18, IV, d, e § 1º, da Lei nº 6.766/1979[1]) – que, no caso, para agravar, também são ex-sócios da loteadora, em cujo quadro social deixaram suas esposas –, basta para o juízo negativo de qualificação registral.

A regra do § 2º do art. 18 da Lei nº 6.766/1979[2] deixa clara a impossibilidade de registro do projeto de loteamento ou de desmembramento, caso existentes processos que contemplem acusações por crimes contra o patrimônio e/ou contra a Administração Pública imputados a quem, nos dez anos que antecederam o pedido de registro de loteamento, foi titular de direitos reais sobre o imóvel a ser loteado.

Nessa hipótese, pouco importa, para fins de ingresso do título no álbum imobiliário, eventual comprovação de que as ações penais não prejudicarão os adquirentes dos lotes e, particularmente, a demonstração de solvabilidade da loteadora, de seus atuais e ex-sócios, dos atuais e ex-proprietários da coisa. A constatação da existência dessas espécies de processos criminais, por si só, afeta, temporariamente, pelo menos, a idoneidade do empreendimento, que envolve elevadíssimos interesses relativos ao direito urbanístico e à oferta pública de lotes.

Essa, inclusive, a justa compreensão do C. CSM: Apelação nº 439-6/5, rel. Des. José Mário Antonio Cardinale, j. 6.12.2005; Apelação nº 856-6/8, rel. Des. Ruy Camilo, j. 11.11.2008; Apelação nº 1.114-6/0, rel. Des. Ruy Camilo, j. 16.6.2009; Apelação nº 0008191-43.2012.8.26.0445, rel. Des. Renato Nalini, j. 10.12.2013; e Apelação nº 9000001-12.2015.8.26.0063, sob minha relatoria, j. 15.3.2016.

Não há, aqui, aliás, ofensa alguma ao princípio da inocência, também conforme a tranquila jurisprudência administrativa deste C. CSM. A propósito, no julgamento da Apelação nº 38.678-0/6, rel. Des. Márcio Martins Bonilha, j. 31.7.1997, decidiu-se:

... essa imposição legal não ofende a regra constitucional que consagra a presunção de inocência, insculpida no artigo 5º, LVII, da Constituição Federal. Relembre-se o que antes já ficou consignado naquele julgado deste Colendo Conselho Superior da Magistratura, que asseverou: "Inspirado no interesse maior, o coletivo, o público, nada impedia que a lei do parcelamento vedasse o registro de loteamento enquanto não deslindado feito penal da espécie mencionada". Acrescentando ainda que: "Nem por isso, todavia, há afronta à presunção de inocência do acusado. Apenas se condiciona o registro do loteamento, a bem da segurança dos adquirentes, ao desfecho absolutório do processo".

O registro do loteamento depende, portanto, de certidão criminal negativa, que demonstre inexistir pendência capaz de levar risco ao empreendimento imobiliário, cujos lotes deverão ser vendidos em oferta pública. Com essa exigência não se está afirmando a culpa dos que estejam sendo acusados desses delitos, antes que ocorra o trânsito em julgado, como aduziu a recorrente.

Importante seja considerada a ratio legis, que, no caso, não leva em conta a culpa desses acusados, mas apenas procura cercar de cuidados o registro do loteamento urbano, com o claro escopo de assegurar o sucesso do empreendimento e de proteger os adquirentes das unidades imobiliárias.

Para tanto, indispensável garantir que a atividade esteja confiada a quem não tenha contra si qualquer pendência que possa, de qualquer modo, ainda que no futuro, comprometer-lhe a idoneidade.

Vale dizer que o registro não estará definitivamente impedido, mas apenas deixado para melhor oportunidade. Sobrevindo solução absolutória, poderá ser deferido.

Sob outro prisma, neste ambiente administrativo, descaberia resolver, mesmo incidentalmente, sobre a constitucionalidade da regra infraconstitucional invocada. No tocante ao tema, além do mais, os esclarecimentos de Vicente Celeste e Vicente de Abreu Amadei são oportunos:

No que tange às certidões de ações penais, se positivas em relação a crimes contra o patrimônio e a crimes contra a administração pública, o registro do parcelamento ficará proibido; condenações criminais por outros ilícitos penais, entretanto, não obstam o registro. ... Saliente-se, por fim, que impedir o registro do parcelamento apenas em vista de processo-crime em curso não é “afronta à presunção de inocência do acusado”, pois “apenas se condiciona o registro de loteamento, a bem da segurança dos adquirentes, ao desfecho absolutório do processo” (Ap. Civ. 24.942-0/4-São Carlos, j. 30.10.95, rel. Des. Alves Braga, DOE 6.12.95, Cad. 1, p. 47. Sobre a matéria, ainda, CSM, Ap. Civ. 31.760-0/0-Porto Feliz).[3]

Em arremate, estéril se apresenta a evocação da teoria do diálogo das fontes; não aproveita, ao pretendido registro, o teor dos arts. 54, 55 e 56 da Lei nº 13.097/2015[4]. Não tem relevância, para a situação enfrentada – que se refere à registrabilidade do loteamento –, a discussão, ora prematura, extemporânea, sobre a eficácia de negócios jurídicos futuros pertinentes à comercialização dos lotes, dependentes daquela inscrição, vedada, entretanto, in concreto, insista-se, pois, no contexto dos autos, sob a lógica de controle legal preventivo, presumidas a inidoneidade e a precariedade do empreendimento.

Quero dizer: a questão da inoponibilidade de fatos e situações não inscritos (especificamente, no caso, dos processos penais) perante futuros e eventuais negócios jurídicos constitutivos, translativos ou modificativos de direitos reais sobre imóveis não se coloca. Os efeitos impeditivos advindos daqueles processos criminais, travando o registro do loteamento, cujas credibilidade e confiabilidade restam, ope legis, estioladas, independem de inscrição no fólio real.

Porém, se fosse para chamar a doutrina preconizada pela interessada, sua incidência não a beneficiaria. O diálogo coerente, coordenado e sistemático (de complementariedade) por meio dela, então, proposto conduziria, diante da ratio comum que anima o § 2º do art. 18 da Lei nº 6.766/1979 e os arts. 54 e 55 da Lei nº 13.097/2015, voltada à proteção de terceiros adquirentes, à confirmação do empeço registral; jamais levaria à inobservância daquela norma (do § 2º do art. 18), ao seu esvaziamento, em técnica infensa à teoria lembrada.

Posto isto, pelo meu voto, porque procedente a dúvida, dou provimento ao recurso.

 

 

PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Assinatura Eletrônica

 

 

[1] Art. 18. Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:

IV – certidões:

d) de ações penais contra o loteador, pelo período de 10 (dez) anos.

§ 1º – Os períodos referidos nos incisos III, alínea b e IV, alíneas a, e d, tomarão por base a data do pedido de registro do loteamento, devendo todas elas serem extraídas em nome daqueles que, nos mencionados períodos, tenham sido titulares de direitos reais sobre o imóvel.

[2] Art. 18. (...)

§ 2º – A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente. (grifei)

[3] Como lotear uma gleba: o parcelamento do solo urbano em todos os seus aspectos (loteamento e desmembramento). 3.ª ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 291-292.

[4] Art. 54.  Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações:

I – registro de citação de ações reais ou pessoais reipersecutórias;

II – averbação, por solicitação do interessado, de constrição judicial, do ajuizamento de ação de execução ou de fase de cumprimento de sentença, procedendo-se nos termos previstos do art. 615-A da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil;

III – averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo de direitos registrados, de indisponibilidade ou de outros ônus quando previstos em lei; e

IV – averbação, mediante decisão judicial, da existência de outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso II do art. 593 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.

Parágrafo único.  Não poderão ser opostas situações jurídicas não constantes da matrícula no Registro de Imóveis, inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel, ressalvados o disposto nos arts. 129 e 130 da Lei no 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, e as hipóteses de aquisição e extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel.

Art. 55.  A alienação ou oneração de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária, parcelamento do solo ou condomínio edilício, devidamente registrada, não poderá ser objeto de evicção ou de decretação de ineficácia, mas eventuais credores do alienante ficam sub-rogados no preço ou no eventual crédito imobiliário, sem prejuízo das perdas e danos imputáveis ao incorporador ou empreendedor, decorrentes de seu dolo ou culpa, bem como da aplicação das disposições constantes da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990. (Vigência)

Art. 56.  A averbação na matrícula do imóvel prevista no inciso IV do art. 54 será realizada por determinação judicial e conterá a identificação das partes, o valor da causa e o juízo para o qual a petição inicial foi distribuída.

§ 1o Para efeito de inscrição, a averbação de que trata o caput é considerada sem valor declarado.

§ 2o A averbação de que trata o caput será gratuita àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.

§ 3o O Oficial do Registro Imobiliário deverá comunicar ao juízo a averbação efetivada na forma do caput, no prazo de até dez dias contado da sua concretização.

§ 4o A averbação recairá preferencialmente sobre imóveis indicados pelo proprietário e se restringirá a quantos sejam suficientes para garantir a satisfação do direito objeto da ação.



Anexos


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