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Diretoria da Corregedoria Geral da Justiça

Despachos/Pareceres/Decisões 16205020/2015


Acórdão - DJ nº 0001620-50.2014.8.26.0586 - Apelação Cível
: 10/03/2015

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0001620-50.2014.8.26.0586, da Comarca de São Roque, em que é apelante GÁS NATURAL SÃO PAULO SUL S/A, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO ROQUE.

 

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U. DECLARARÁ VOTO CONVERGENTE O DESEMBARGADOR ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

 

 São Paulo, 3 de março de 2015.

 

        

     ELLIOT AKEL

RELATOR

 

 

 

 

Apelação Cível nº 0001620-50.2014.8.26.0586

 Apelante: Gás Natural de São Paulo Sul S/A

 Apelado: Oficial do Cartório de Registro de Imóveis de São Roque

 Voto nº 34.156

 

REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA - CARTA DE SENTENÇA - SERVIDÃO ADMINISTRATIVA - PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE - IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DA SERVIDÃO DENTRO DA ÁREA DO IMÓVEL ATINGIDO, EM RAZÃO DA DESCRIÇÃO LACUNOSA CONTIDA DA TRANSCRIÇÃO – REGISTRO E ABERTURA DE MATRÍCULA RECUSADOS – DÚVIDA PREJUDICADA, PORÉM, EM RAZÃO DA CONCORDÂNCIA QUANTO A OUTRA EXIGÊNCIA FEITA.

 

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis de São Roque, derivada da negativa de abertura de matrícula e registro de servidão administrativa em favor da suscitada.

Consta dos autos que a suscitada obteve, por meio de ação ordinária, a constituição de servidão administrativa. Para seu registro, teria de ser aberta matrícula, derivada da transcrição nº 5.629, mas o Oficial entendeu que a descrição do imóvel, constante dessa transcrição, é absolutamente insuficiente, de modo que a admissão do título malferiria o princípio da especialidade objetiva. Além disso, também a qualificação do titular estaria imperfeita, faltando a indicação de seu número de inscrição no CPF/MF. O registro foi então negado, sob o fundamento de que seria necessário o procedimento de retificação da área, além da completa qualificação do proprietário.

A sentença prestigiou esse entendimento e julgou procedente a dúvida.

Em seu recurso, a apelante alega que o CPF/MF do proprietário já foi fornecido. No que concerne à retificação, entende que não tem legitimidade para fazê-la e a exigência não é razoável. Afirma que a descrição do imóvel é suficiente, que a servidão está bem caracterizada e que o princípio da segurança jurídica impõe que se registre tal servidão, para ciência de terceiros.

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

 

A dúvida está prejudicada. A exigência de completa qualificação do proprietário foi cumprida ao longo do procedimento, o que não se admite. A concordância parcial com as exigências do Oficial prejudica o pedido, que só admite duas soluções: a determinação da averbação do título protocolado e prenotado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava no momento em que surgida dissensão entre a apresentante e o Oficial de Registro, ou a manutenção da recusa do Oficial.

Para que se possa decidir se o documento pode ser averbado ou não é preciso que todas as exigências – e não apenas parte delas – sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior.

Conquanto prejudicada a dúvida, entendo conveniente, por razão de ordem prática, analisar nesta oportunidade, a questão de fundo, evitando-se que, qualificado o proprietário, a interessada venha a se valer novamente do mesmo procedimento.

Não se trata de resposta a consulta a respeito de direito em tese, mas de análise de caso concreto. O Conselho não estará atuando como órgão consultivo, mas como regulador de uma situação de fato. Uma vez resolvida a controvérsia, o tema não será mais levado à Corregedoria Permanente, dado que o Oficial já terá orientação clara sobre como proceder.

Ao contrário do exercício de função jurisdicional, cuja essência é teleológica, a função administrativa, exercida no âmbito do julgamento das dúvidas, tem caráter disciplinador. Enquanto no âmbito jurisdicional visa-se ao julgamento do mérito, com posterior formação de coisa julgada e impossibilidade de rediscussão para as partes, o julgamento das dúvidas não se presta somente a decidir o caso concreto, mas a servir de orientação aos registradores para casos análogos.

Logo, por esses dois ângulos é importante a análise do mérito, ainda que prejudicada a dúvida: a) evita-se a nova suscitação; b) fixa-se orientação para casos similares.

Passa-se ao exame do caso, portanto.

Em primeiro lugar, ressalte-se que a origem judicial do título não torna prescindível a qualificação registrária, conforme pacífico entendimento do Conselho Superior da Magistratura:

Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental (Ap. Cível nº 31881-0/1).

 

Para o registro da servidão administrativa, é necessária a abertura de matrícula, oriunda da transcrição nº 5.629.

Agiu corretamente, o Oficial, ao verificar que a abertura de matrícula, à mingua de uma descrição suficiente da área e dos limites do imóvel, feriria o princípio da especialidade objetiva.

Além da descrição precária, sequer foi apresentada planta para conferência da especialização da faixa de servidão, com amarração ao perímetro do imóvel gravado. Os poucos documentos que instruem o título (fls. 33 e seguintes), embora mencionem a área da servidão, não a relacionam, de maneira segura, com a área do imóvel, o que impede, como dito, a amarração.

É certo que o Conselho Superior da Magistratura tem entendido que, inobstante a precariedade dos dados, como regra, não há razão para impedir o registro quando haja coincidência entre a descrição do título e da matrícula.

Esse entendimento tem sido prestigiado e até ampliado pelo CSM e por esta Corregedoria Geral da Justiça, podendo-se citar, a respeito, a decisão proferida Apelação Cível nº 9000002-16.2011.8.26.0296, em que o Conselho admitiu o registro mesmo no caso em que a descrição deficiente constava da matrícula e não de transcrição. O que importa é que a descrição do título, ainda que precária, coincida com a do registro de imóveis.

A questão, aqui, no entanto, é diferente. A servidão administrativa, uma vez registrada, constitui direito real a favor de seu titular. E não se pode admitir a constituição de um direito real sem qualquer certeza sobre a amarração da área objeto da servidão à base territorial sobre a qual está sendo implantada.

É correto o entendimento acerca da importância do princípio da segurança jurídica, que decorre do registro. O Conselho Superior da Magistratura tem mitigado o princípio da especialidade objetiva, não apenas nos casos acima mencionados – coincidência entre os elementos do título e da transcrição ou matrícula -, mas, também, nas hipóteses de averbação de Reserva Florestal. Nesse sentido é o voto proferido no Recurso Administrativo 77655/2012, da lavra do então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini.

Contudo, mesmo no corpo desse voto pode-se verificar que a mitigação liga-se aos atos de cadastro, e não de registro. Veja-se:

“Consideradas, além disso, as diferenças existentes entre cadastro e registro, destacadas por Marcelo Augusto Santana de Melo, há mais um motivo para a suavização da rigidez do princípio da especialidade, porquanto aquele, não este, registro, serve de instrumento para Administração controlar a arrecadação de tributos, o cumprimento de funções administrativas e, no que interessa particularmente a este parecer, monitorar o acatamento das obrigações ambientais...”

Embora nas hipóteses de averbação da reserva, por se tratar de uma questão de cadastro, não haja criação de um direito real, aqui a situação é diversa. Cria-se, com a constituição da servidão, um novo direito real. E ele não pode prescindir da especialidade, pois isso implicaria em ofensa à segurança jurídica.

Ademais, não há qualquer óbice prático a que a apelante promova a retificação da área, na condição de interessada no registro da servidão. É o que se colhe do voto da apelação n. 314-6/5, da lavra do então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Mário Antonio Cardinale, hipótese bastante similar à presente (embora, lá, a descrição do imóvel fosse suficiente):

“A apelante pretende o registro de instrumento de constituição de servidão de passagem de linha de transmissão de energia elétrica que, segundo alega, atinge o imóvel objeto da matrícula 9.949 do Registro de Imóveis da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo.

Referido imóvel, apesar de ter sofrido desmembramentos, tem sua área remanescente descrita na matrícula 9.949 com indicação de marcos seguros, consistentes em linha de inundação, estacas e cotas de represa da CESP.

Esses marcos, em conjunto com a planta da represa e com os demais elementos que poderão ser obtidos a partir da identificação dos registros dos imóveis confinantes, em tese permitem identificar a correta base geodésica do imóvel.

Ocorre que esses elementos e plantas, que são necessários para identificar o imóvel indicado como serviente, não acompanharam o título de constituição da servidão, pois a apelante se limitou a apresentar memorais e plantas que somente identificam as áreas das servidões de passagem que pretende registrar (fls. 18/23 e 25/33).

No que se refere ao imóvel supostamente serviente os documentos apresentados somente repetem a descrição contida na matrícula nº 9.949 (fls. 18/19), o que não é suficiente para demonstrar que a área atingida pela servidão nele efetivamente está situada.

Desta forma, a descrição do remanescente do imóvel contida na matrícula nº 9.949 não é suficiente para permitir o registro do instrumento de servidão de passagem que, no presente caso, não está acompanhado de qualquer planta ou mapa que permita identificar a área do imóvel serviente e, dentro desta, a da servidão que se pretende registrar.

Ademais, a forma adotada para a descrição da área da servidão é diferente da utilizada na descrição do imóvel atingido e não existem, nessas descrições, elementos coincidentes que permitam localizar a área da servidão como situada dentro do imóvel supostamente serviente.

Em razão disso, e diante do princípio da especialidade, não há como admitir o registro pretendido pela apelante.

Cabe ressalvar, entretanto, que embora tenha a apelante legitimidade para promover a retificação do registro do imóvel supostamente atingido pela servidão, na forma do artigo 212 da Lei 6.015/73, com a redação dada pela Lei nº 10.931/04, poderá ser esta medida desnecessária para o registro pretendido caso o título seja reapresentado em conjunto com plantas e memoriais suficientes para demonstrar que a área da servidão de passagem está inserida no imóvel objeto da matrícula nº 9.949.”

 

Por fim, cai a talhe o precedente que segue, no mesmo sentido do presente voto:

 

“REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida julgada procedente - Negado registro de carta de adjudicação expedida em ação de instituição de servidão administrativa - Título que apresenta descrição precária dos imóveis em que recaiu a servidão - Ofensa ao princípio da especialidade objetiva - Recurso não provido –CSM- Apel.Cível: 1.204-6/0 DATA JULGAMENTO: 20/10/2009 DATA DJ: 03/12/2009 - Relator: Reis Kuntz

 

A questão não é nova, sendo diversos os precedentes deste Egrégio Conselho Superior da Magistratura, no sentido de que o registro da servidão administrativa se submete aos princípios informadores dos registros públicos, em especial o da especialidade, contrapondo-se, portanto, à jurisprudência mencionada pela apelante.

Nesse sentido, tendo em vista a semelhança da hipótese apreciada, vale invocar, verbi gratia, o V. Acórdão proferido na Apelação Cível n° 745-6/1, da Comarca de São Paulo, também interposta pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP, em que figurou como relator o E. Desembargador Gilberto Passos de Freitas, então Corregedor Geral da Justiça:

 

REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida procedente. Carta de adjudicação. Instituição de servidões administrativas. Falta de precisa ubiqüação do suporte geodésico em que se buscam incidir as servidões, por descrições deficientes, que não permitem a amarração necessária. Recusa registrária correta. Recurso conhecido e não provido.

 

(...)

 

2. Pretende-se, em dúvida, o registro de carta de adjudicação expedida pelo Juízo de Direito da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, referente à instituição de servidão administrativa não aparente em favor da apelante, para implantação de adutora, em duas faixas de terreno, uma de 823,50 m², outra de 3.024,39 m², gravando os imóveis das matriculas 50.825 e 72.060, respectivamente, ambas do 7º Registro de Imóveis da Capital.

Destaque-se, de saída, que a natureza judicial do título, consoante vasta orientação jurisprudencial, não inibe a qualificação registrária, inclusive em caso de carta de adjudicação referente à instituição de servidão administrativa (v.g., CSM, Apelações Cíveis nºs 79.429-0/0, 60-6/5 e 63-6/9).

Outrossim, é certo que as servidões administrativas sobre imóveis (e esse é o caso dos autos), que não se confundem com as servidões civis (disciplinadas pelo Código Civil), também são registráveis, como prevê o artigo 167, I, nº 6, da Lei de Registros Públicos (cf. José Carlos de Moraes Salles, A Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 5ª edição, Ed. RT, 2006, p. 786), mediante apresentação de título adequado ("são, geralmente, instituídas por acordo administrativo ou sentença judicial", mas "podem, constituir-se, ainda, por acessão ou pela prescrição aquisitiva [RDA 43/26]" José Carlos de Moraes Salles, ob. cit., p. 786), ainda que o registro perseguido não tenha efeito constitutivo, diante de sua finalidade "meramente publicitária, porquanto não é a inscrição a causa suficiente e necessária para a constituição do direito real" (parecer de lavra do Doutor Aroldo Mendes Viotti, Apelação Cível n. 8.194-0/2, da Comarca de Santos, relator Desembargador Milton Evaristo dos Santos).

Todavia, as servidões administrativas não têm natureza similar à da desapropriação, sequer parcial, como modo originário de aquisição de domínio, sendo, diversamente, mero direito real de gozo, de natureza pública, instituído sobre imóvel de propriedade alheia (cf. Maria Sylvia Zanella di Pietro, Direito Administrativo, 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 145). Logo, seus registros não fogem à observância dos princípios registrais, inclusive os de continuidade e especialidade (CSM, Apelações Cíveis nºs 122-6/9, 456-6/2, 454-6/3 e 666-6/0).

 

No caso, como bem pondera o registrador, as matrículas 50.825 e 72.060 revelam descrições deficientes e incompletas, carecendo de elementos que permitam a amarração das servidões, por falta de medidas perimetrais conformadoras da figura geométrica.

Não é possível, pois, identificar as servidões na base física dos domínios publicados nos fólios reais acima apontados, ou seja, nas áreas dos imóveis supostamente atingidos, em virtude das lacunas descritivas daquelas matrículas, o que inibem os registros pretendidos, sob pena de ofensa ao princípio da especialidade objetiva.

Neste sentido são os precedentes do Colendo Conselho Superior da Magistratura: Apelações Cíveis 68.468-0/2, 353-6/2, 666-6/0, entre outras.

Não se ignoram, ainda, julgados no foco da mitigação de rigor aos princípios registrários em sede de servidão administrativa (v.g. CSM, Apelação Civil 75.910-0/7); todavia, isso não afasta a necessidade de precisa ubiqüação do suporte geodésico em que se buscam incidir as servidões.

Confira, porque oportuno, parte do v. acórdão do Conselho Superior da Magistratura, referente à Apelação Cível 353-6/2-Avaré, relatado pelo Desembargador José Mário Antonio Cardinale:

"...não se dispensa, ao registro da instituição da servidão, e como se disse, ao menos a identificação da base física sobre a qual incidirá, ou seja, dos imóveis que suportarão a restrição. A argumentação a respeito desenvolvida pela recorrente diz com a mitigação do controle da disponibilidade qualitativa, ao que serve a alegação de que a servidão se institua intra muros'.

Mas isso não significa dispensar a exata individuação da base física sobre a qual se assentará a restrição, dos imóveis, enfim, que suportarão a servidão. Como já se decidiu, a servidão administrativa pressupõe a aderência a uma base física preexistente e que deve estar matriculada. Embora os rigores dos princípios registrários sejam mitigados, no que se refere ao controle qualitativo da especialidade, exige-se, sempre, o antecedente lógico-registral do conhecimento da matrícula que deva receber a inscrição e da possibilidade de seu descerramento.' (Apelação Cível n. 30.727-0/2)".

Por conseqüência, inadmissível o registro do título judicial'.

De igual teor o V. Acórdão citado no julgado supra e no parecer da D. Procuradoria Geral de Justiça, proferido na Apelação Cível n° 353-6/2, da Comarca de Avaré, em que figurou como relator o E. Desembargador José Mário Antonio Cardinale, então Corregedor Geral da Justiça:

Registro de Imóveis - Dúvida - Carta de adjudicação - Servidão administrativa - Princípio da especialidade - Impossibilidade de identificar a servidão dentro da área do imóvel supostamente atingido, em razão da descrição lacunosa contida na matrícula para este aberta - Registro recusado - Recurso a que se nega provimento.

(...)

'2. Este Colendo Conselho Superior da Magistratura tem reiteradamente decidido que a origem judicial do título apresentado para registro não o torna imune à qualificação registrária. Neste sentido, entre outros, os v. acórdãos prolatados nas Apelações Cíveis nº 71.397-0/5 e nº 76.101-0/2, ambas da Comarca da Capital, e o v. acórdão prolatado na Apelação Cível nº 30.657-0/2, da Comarca de Praia Grande, relator o Desembargador Márcio Martins Bonilha, em que decidido:

Em primeiro lugar, salienta-se que o fato de ser apresentado a registro um título de origem judicial não o isenta do exame qualificativo dos requisitos registrários, cabendo ao registrador, como o firmado na Ap. Cível 15.028-0/7, da mesma Comarca de Praia Grande, apontar eventual hipótese de incompetência absoluta da autoridade judiciária, aferir a congruência do que se ordena, apurar a presença de formalidades documentais e, finalmente, analisar existência de eventuais obstáculos registrários, como é o caso.

3. A servidão administrativa, conforme a carta de adjudicação (fls. 11), foi constituída sobre o imóvel objeto da matrícula nº 4.681 do Registro de Imóveis de Avaré que, no entanto, contém descrição precária, sem medidas perimetrais, o que impede a identificação de sua área e a localização, dentro desta, da parcela afetada pela servidão (fls. 74).

Disso decorre a procedência da dúvida, pois embora a servidão administrativa tenha características próprias não está seu registro imune aos princípios orientadores dos registros públicos, em particular o da especialidade, ainda que sob a justificativa de atendimento do interesse público.

4. Por fim, a constituição de servidão administrativa não se equipara à desapropriação do domínio para o efeito de considerarse forma originária de aquisição de propriedade imóvel, como ficou assentado no v. acórdão prolatado por este C. Conselho Superior na Apelação Cível nº 097869-0/0, da Comarca de Espírito Santo do Pinhal, relator o Desembargador Luiz Tâmbara, em que decidido:

"A propósito, é bem de ver que o Conselho Superior da Magistratura já teve oportunidade de acentuar a necessidade, mesmo em se tratando de servidão administrativa, de precisa identificação dos limites em que se contém, dada a deficiente descrição da base física sobre a qual se assenta (Apelação Cível n. 68.468-0/2)".

Na verdade, isso porquanto à aquisição dessa servidão não se pode pretender emprestar a natureza originária, a exemplo do que se dá com a desapropriação, e só porque a indenização pelo estabelecimento do ônus se faz nos termos do Decreto-lei 3.365/41 (art. 40). Também é da jurisprudência do Conselho Superior que "a instituição de servidão administrativa não tem, como afirma a recorrente, natureza similar à de uma desapropriação parcial, de forma a representar modo de aquisição originária do domínio." (Apelação Cível nº 68.719-0/9 e 68.745-0/7). Não por diverso motivo, como está nos mesmos arestos, a sua inscrição deve se fazer em face do título anterior do domínio.

Tanto quanto, por identidade de razões, não se dispensa, ao registro da instituição da servidão, e como se disse, ao menos a identificação da base física sobre a qual incidirá, ou seja, dos imóveis que suportarão a restrição. A argumentação a respeito desenvolvida pela recorrente diz com a mitigação do controle da disponibilidade qualitativa, ao que serve a alegação de que a servidão se institua "intra muros". Mas isso não significa dispensar a exata individuação da base física sobre a qual se assentará a restrição, dos imóveis, enfim, que suportarão a servidão. Como já se decidiu, a servidão administrativa "pressupõe a aderência a uma base física preexistente e que deve estar matriculada. Embora os rigores dos princípios registrários sejam mitigados, no que se refere ao controle qualitativo da especialidade, exige-se, sempre, o antecedente lógico registral do conhecimento da matrícula que deva receber a inscrição e da possibilidade de seu descerramento." (Apelação Cível n. 30.727-0/2)'.

Igual entendimento foi adotado, mais recentemente, no V. Acórdão proferido na Apelação Cível n° 943-6/5, da Comarca de São José do Rio Preto, em que figurou como relator o E. Desembargador Ruy Pereira Camilo, então Corregedor Geral da Justiça, conforme a ementa seguinte:

 

REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida procedente. Servidão para passagem de linha de esgoto. Exigência de retificação de registro, dada a precariedade da descrição do imóvel matriculado. Ausência de medidas perimetrais e de amarração geográfica. Impossibilidade de localizá-lo com precisão e de nele situar a faixa de servidão. Princípio da especialidade. Provimento negado, com observação.

 

Na hipótese dos autos, como visto, os imóveis não estão perfeitamente identificados no título, o que inviabiliza a localização segura da servidão que foi instituída, mostrando-se de rigor, portanto, a manutenção da recusa de registro da carta de adjudicação em exame.”

 

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, nega-se provimento ao recurso.

 

 

 

HAMILTON ELLIOT AKEL

           Corregedor Geral da Justiça e Relator

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apelação Cível nº 0001620-50.2014.8.26.0586

Apelante: Gás Natural de São Paulo Sul S. A.

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis da comarca de São Roque

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO CONVERGENTE

 

VOTO N. 29.852

 

 

1. Gás Natural de São Paulo Sul S. A. interpôs apelação contra a sentença que deu por procedente dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis da comarca de São Roque. Segundo essa decisão, o teor da transcrição 5.629 não serve para a abertura de matrícula e o registro de servidão administrativa pretendidos pela apelante, uma vez que a descrição do imóvel é insuficiente e a qualificação do proprietário é incompleta, por falta de CPF. Logo, a retificação é necessária, e até que se faça não se pode atender a pretensão da apelante.

 

 A apelante afirma que já forneceu o CPF do proprietário, mas alega que não tem legitimidade para promover a retificação, a qual, além disso, não é exigência razoável.

 

 2. Respeitável é o entendimento do eminente Desembargador Relator ao dar por prejudicada a dúvida. Isto porque, a apelante anuiu a uma das exigências feita pelo ofício de registro de imóveis.

 

 No entanto, diverge-se quanto à apresentação de solução que, em tese, deveria dar-se ao caso, na hipótese de conhecimento do recurso.

 

 Em primeiro lugar, este Conselho só há de conhecer do mérito, se antes não conhecer de preliminar que com ele seja incompatível (CPC/1973, art. 560, caput). Disso se conclui que, se houver (como in casu houve) preliminar que impeça o exame do mérito, sobre ele não cabe pronunciamento. Há de ser entregue a prestação jurisdicional, e não mais que isso. Como diz Pontes de Miranda (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1975, tomo VIII, p. 266):

 

Se a decisão na preliminar processual ou na questão prejudicial elimina o julgamento do mérito, claro que não mais se prossegue; julgado está o feito; a decisão, por si só, é terminativa.

 

Como se sabe, as decisões deste Conselho gozam de inegável prestígio e (como salienta o Desembargador Relator), servem de orientação para registradores, tabeliães, juízes e partes. Justamente por isso é que os acórdãos devem contar o que a lei efetivamente permite que seja objeto do julgamento de todos os integrantes do Conselho. No caso de dúvida prejudicada, esse objeto, como se disse, restringe-se à matéria preliminar; logo, a nenhum integrante do colegiado é permitido valer-se da ocasião para inserir e fazer prevalecer a sua opinião sobre a matéria de fundo, sem que esta, contudo, pudesse ter sido legalmente examinada, discutida e votada por todos os integrantes do Conselho. Ademais, a propositura de medidas convenientes ao aprimoramento dos serviços das delegações notariais e de registro e estabelecer a respectiva orientação superior é tarefa do Corregedor Geral da Justiça (Regimento Interno, art. 28, XVIII e XXXI), mas não do Conselho Superior da Magistratura, que, em matéria notarial e registral é chamado a decidir processos (Regimento Interno, art. 16, IV).

 

 Em segundo lugar, é entendimento consolidado que o Poder Judiciário – mesmo no exercício de função administrativa, como seja a corregedoria dos serviços extrajudiciais – não é órgão consultivo, e que as consultas só muito excepcionalmente se devem admitir, em hipóteses de extrema relevância:

 

Ora, por tudo isso se evidencia a completa carência de interesse e legitimação para o reclamo assim tão singularmente agitado, por quem, não dispondo, ainda, da titularidade do domínio (condomínio), não poderia alegar lesão ou ameaça de lesão, por parte da administração, a um direito seu, que sequer existe. O pedido, na verdade, traduziria inconcebível e descabida consulta dirigida ao Judiciário, ainda que na sua função atípica de agente administrativo, sobre interpretação e aplicação, em tese, das leis e regulamentos. Nesse sentido, é da melhor doutrina que a "reclamação administrativa é a oposição expressa a atos da Administração, que afetem direitos ou interesses legítimos dos administrados. O direito de reclamar é amplo, e se estende a toda pessoa física ou jurídica que se sentir lesada ou ameaçada de lesão pessoal ou patrimonial por atos ou fatos administrativos" (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 3ª ed., Revista dos Tribunais, p. 617 e Caio Tácito, Direito Administrativo, 1975, Saraiva, p. 29), pressupostos esses que, absolutamente ausentes na hipótese, inviabilizam, por completo, a postulação inicial. (Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, Proc. 53/1982, parecer do juiz José Roberto Bedran, 22.7.1982, g. n.)

 

A E. Corregedoria Geral da Justiça, em regra, e conforme pacífica orientação, não conhece de consultas, cujo exame, portanto, excepcional, fica condicionado à peculiaridade do assunto, sua relevância e o interesse de âmbito geral da matéria questionada. (Corregedoria Geral da Justiça, Proc. CG 10.715/2012, Des. José Renato Nalini, j. 18.12.2013).

 

Como é sabido, não cabe a este Juízo responder a consultas formuladas pelo interessado, pois a sua função primordial é solucionar conflitos e não figurar como consultor jurídico. Além disso, como bem observou a Douta Promotora: "Conforme já decidiu a E. Corregedoria Geral da Justiça, em parecer exarado pelo então Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. Hélio Lobo Júnior, no procedimento n° 27.435/88 (02/89):"...é inconcebível e descabida consulta dirigida ao Judiciário, ainda que na sua função atípica de agente administrativo, sobre interpretação e aplicação, em tese, das leis e regulamentos (cf. ementa 10.2, das Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça - Ed. RT, 1981/1982, p. 24). Neste mesmo sentido, manifestou-se o Dr. Aroldo Mendes Viotti, D. Juiz Auxiliar da Corregedoria, em parecer proferido nos autos do procedimento n° 113/90 (567/90), onde consta: "O comando emergente do dispositivo da r. sentença não pode - por isso - prevalecer, porquanto não é dado ao Juízo Corregedor Permanente emitir declaração positiva ou negativa de registro de título no Ofício Predial sem regular instauração de procedimento de dúvida, e sem que, consoante o devido procedimento de lei, se materialize o dissenso entre particular e registrador acerca daquele ato de registro. A atuação do Juízo da dúvida dirige-se tão-somente à revisão da atividade do registrador, devolvendo-se-lhe a tarefa de qualificação a este cabente em primeiro momento: não pode o Juízo administrativo, porém, substituir-se ao Oficial nessa primeira atividade, isto é, apreciar a registrabilidade de título sem que o responsável pelo Cartório Predial, em momento anterior, o faça. Por incômodo ou intrincado que se revele o ônus de qualificação dos títulos, dele deverá se desincumbir o Serventuário, nada justificando busque transferi-lo a terceiros. Também se presume detenha o titular da Serventia Imobiliária capacitação técnica não apenas para operacionalizar os comandos legais que disciplinam a questão da preferência a registro de títulos constitutivos de direitos reais reciprocamente contraditórios, como, igualmente, para conhecer os efeitos jurídicos que possam advir das medidas previstas nos arts. 867 e ss. (Seção X, Livro III) do CPC. Por isso, não cabia ao Juízo Corregedor fornecer resposta à consulta do Serventuário. Também não lhe era dado determinar registro de títulos à margem do procedimento legal, e sem que o registrador se houvesse previamente desincumbido de seu ônus de emitir juízo conclusivo a respeito de sua registrabilidade". (Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo, autos 1023331-97.2014.8.26.0100, Juíza Tania Mara Ahualli, j. 16.05.2014)

 

3. Ante o exposto, não conheço do recurso de apelação.

 

ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO

Presidente da Seção de Direito Privado

 

 

 



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