Despachos/Pareceres/Decisões
27530920/2013
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Acórdão - DJ nº 0002753-09.2013.8.26.0281 - Apelação Cível
: 18/12/2013
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0002753-09.2013.8.26.0281, da Comarca de Itatiba, em que é apelante VILLE DE FRANCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE ITATIBA.
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, ELLIOT AKEL, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.
São Paulo, 10 de dezembro de 2013.
RENATO NALINI
RELATOR
Apelação Cível nº 0002753-09.2013.8.26.0281
Apelante: Ville de France Empreendimentos Imobiliários Ltda.
Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itatiba
VOTO Nº 21.365
REGISTRO DE IMÓVEIS – Registro de loteamento - Certidões e documentos previstos no art. 18, da Lei no 6.766/76 - Exame, pelo Oficial de Registro de Imóveis, dos esclarecimentos prestados pelo loteador - Possibilidade - § 2º, do art. 18, da Lei 6.766/79 - Loteamento a ser implantado em imóvel objeto de alienação fiduciária - Negócio jurídico que obsta o registro do loteamento - Recurso não provido.
Inconformada com a r. decisão que julgou prejudicada a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itatiba em relação à qualificação que recaiu sobre o projeto de loteamento, apela Ville de France Empreendimentos Imobiliários Ltda. aduzindo, em síntese, que o fato de o imóvel em que o loteamento será edificado ser objeto de alienação fiduciária não obsta o registro pretendido.
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
De início, respeitado o entendimento do MM. Juiz Corregedor Permanente, observe-se que a dúvida não está prejudicada.
É que o dever de impugnar todas as exigências feitas pelo Oficial de Registro de Imóveis só ocorre no caso de suscitação de dúvida indireta - que é a requerida pelo próprio interessado e não pelo Oficial.
Quando a dúvida é direta (suscitada pelo Oficial, como no presente caso), basta ao interessado no registro, frente à nota devolutiva e dentro do prazo da prenotação, requerer a suscitação, cabendo ao Oficial, ao redigir a “petição inicial” da dúvida, mencionar e justificar o porquê de cada uma das exigências.
Superada essa preliminar, passo a examinar o mérito.
Ao expedir a nota devolutiva, o Oficial de Registro de Imóveis de Itatiba fez duas exigências (fl. 406).
A primeira diz respeito às certidões exigidas nos incisos III e IV, do art. 18, da Lei no 6.766/79:
Art. 18. Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:
III - certidões negativas:
a) de tributos federais, estaduais e municipais incidentes sobre o imóvel;
b) de ações reais referentes ao imóvel, pelo período de 10 (dez) anos;
c) de ações penais com respeito ao crime contra o patrimônio e contra a Administração Pública.
IV - certidões:
a) dos cartórios de protestos de títulos, em nome do loteador, pelo período de 10 (dez) anos;
b) de ações pessoais relativas ao loteador, pelo período de 10 (dez) anos;
c) de ônus reais relativos ao imóvel;
d) de ações penais contra o loteador, pelo período de 10 (dez) anos.
O § 2º, do art. 18, da Lei 6.766/79, confere autorização expressa ao Oficial de Registro de Imóveis para examinar as certidões e os esclarecimentos apresentados pelo loteador e, mais que isso, fazer juízo de valor a respeito da viabilidade do loteamento à luz de eventual potencial prejuízo aos futuros adquirentes:
§ 2º - A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente.
Assim, apenas no caso de considerar insuficientes as justificativas apresentadas é que o Oficial de Registro de Imóveis deve suscitar dúvida, como expressamente ressalva a parte final do dispositivo acima.
No presente caso, porém, ao suscitar a dúvida, o Oficial disse que reputava suficiente as explicações da loteadora referentes aos protestos e ações em curso.
Ora, se considerou bastantes e suficientes as explicações ofertadas pelo loteador, não havia por que fazer a exigência.
De todo modo, o exame dos documentos acostados aos autos permite concluir, como bem destacou a r. decisão recorrida, pela existência de patrimônio bastante do loteador a não colocar em risco os futuros adquirentes, não havendo, destarte, controvérsia quanto a este ponto.
O segundo item da nota devolutiva é, no entanto, pertinente.
O art. 18, da Lei no 6.766/79, ao arrolar os documentos que o loteador deverá apresentar ao Registro de Imóveis, menciona no inciso I o título de propriedade.
É pressuposto do loteamento, assim, a condição plena de titular do domínio do loteador.
No caso posto, esse requisito não restou atendido porque o loteador deu em garantia da alienação fiduciária o imóvel em que o loteamento será edificado (R.01, M. 51218 – fls. 143/144).
Ao celebrar referido negócio jurídico, o loteador transferiu a propriedade do imóvel ao fiduciário, passando a ter, enquanto não paga a dívida, mera expectativa de reaver a propriedade, além da posse direta.
É o que se extrai da leitura do at. 22, da Lei no 9.514/97:
Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.
Ao discorrer sobre a propriedade fiduciária, Francisco Eduardo Loureiro diz que a propriedade transmitida ao credor fiduciário em garantia é resolúvel, por ser subordinada a um evento futuro e incerto, qual seja, o adimplemento da obrigação garantida. E, ao falar do devedor fiduciante, afirma que tem ele a propriedade sob condição suspensiva, vale dizer, a legítima expectativa de recuperar o domínio da coisa, tão logo cumpra a obrigação garantida, sem que a isso possa se opor o credor (Código Civil Comentado, Manole, 6ª ed., p. 1411/1412).
Fácil de ver, por conseguinte, que o devedor fiduciante, enquanto não saldar a dívida, não pode ser considerado proprietário para os fins do art. 18, I, da Lei nº 6.766/79.
Na linha da impossibilidade do registro do loteamento em imóvel alienado fiduciariamente, o r. parecer da ilustrada Procuradoria Geral de Justiça.
Isto posto, nego provimento ao recurso.
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator
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