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Diretoria da Corregedoria Geral da Justiça

Despachos/Pareceres/Decisões 19910772/2013


Acórdão - DJ nº 0019910-77.2012.8.26.0071 - Apelação Cível
: 24/05/2013

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0019910-77.2012.8.26.0071, da Comarca de Bauru, em que é apelante CONDOMÍNIO BAURU SHOPPING CENTER, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE BAURU.
 
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO PARA JULGAR IMPROCEDENTE A DÚVIDA E DETERMINAR O REGISTRO DA ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E COMPRA, V.U,", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, Decano em exercício, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.
 
 São Paulo, 18 de abril de 2013.
 
         
     RENATO NALINI
RELATOR
 
Apelação Cível n.º 0019910-77.2012.8.26.0071
Apelante: Condomínio Bauru Shopping Center
Apelada: Oficial do 1.º Registro de Imóveis e Anexos da Comarca da Bauru
VOTO Nº 21.240
 
 
 
REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de venda e compra – Aquisição de bens imóveis para ampliação das vagas de estacionamento – Negócio jurídico relacionado com atividade-fim do Condomínio – Aprovação pela unanimidade dos condôminos presentes em assembleia – Proveito dos condôminos evidenciado – Risco de sanção administrativa – Inconveniente prático da exigência relativa ao consentimento de todos os condôminos – Instrumentalidade registral –Ausência de personalidade jurídica não é óbice, in concreto, ao registro – Pertinência do assento pretendido – Dúvida improcedente – Recurso provido.
 
 
 
 
 
 
O Oficial de Registro, provocado pelo interessado, suscitou dúvida onde reafirmou a nota devolutiva n.º 5.412 – ao insistir que o interessado não tem personalidade jurídica e apenas excepcionalmente, nas situações admitidas pela jurisprudência administrativa, pode comprar bens imóveis –, e salientou que erro pretérito, associado a um antigo registro de aquisição de imóvel por ele efetivada, não justifica o cometimento de outro (fls. 05/08).
Ao apresentar impugnação, o interessado reiterou a manifestação mediante a qual requereu suscitação de dúvida: enfim, enfatizou que a aquisição dos imóveis visam à ampliação das vagas de estacionamento; alegou a inviabilidade da formalização do negócio jurídico com a participação de todos os condôminos, que o aprovaram, conduto, em assembleia geral; e invocou lições doutrinárias, precedentes jurisprudenciais e enunciados das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (fls. 30/45, 67 e 75).
Depois da manifestação do Ministério Público pelo registro do título (fls. 69/74), a dúvida foi julgada procedente (fls. 77/81), motivo pelo qual o interessado, com reprodução de suas alegações passadas, interpôs apelação (fls. 88/110), recebida no duplo efeito (fls. 112). Enviados os autos ao Conselho Superior da Magistratura (fls. 117/123), abriu-se vista à Procuradoria Geral da Justiça, que propôs o desprovimento do recurso (fls. 127/128).
É o relatório.
O interessado, ora apelante, após aprovação obtida por unanimidade em assembleia de condôminos (fls. 64), adquiriu, mediante escritura pública de venda e compra, os imóveis descritos nas matrículas n.º 104.226 e n.º 104.227 do 1.º Registro de Imóveis de Bauru (fls. 25/26), com a finalidade de ampliar as vagas de estacionamento, exigida pela expansão de sua área construída e pela Prefeitura do Município de Bauru.
Porque o interessado, apelante, é desprovido de personalidade jurídica, o Oficial do 1.º Registro de Imóveis de Bauru emitiu um juízo negativo de qualificação registral (fls. 79), realçando que as situações excepcionais autorizadoras de aquisição de imóvel pelo condomínio edilício não estão configuradas.
O condomínio não tem personalidade jurídica, de acordo com a legislação civil em vigor, a despeito do enunciado n.º 90 da I Jornada do Conselho da Justiça Federal, cujo texto, consolidado após alteração promovida pelo enunciado n.º 246 da III Jornada, estabelece, ao comentar o artigo 1.331 do CC/2002, que “deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício.”
A propósito, Caio Mário da Silva Pereira, ao tratar da natureza jurídica do condomínio edilício e prestigiar a asserção acima feita, rechaça, com veemência, a personalidade jurídica que muitos atribuem a esse fenômeno econômico e jurídico:
Problema que tem dividido juristas e tribunais é o que condiz com a caracterização da natureza jurídica deste condomínio sui generis. Não faltam escritores que o consideram como nova modalidade de pessoa jurídica, ora de cunho societário, ora como universalidade (Jair Lins, Leon Hennebier). Outros invocam institutos tradicionais para explicar a sua existência: direito superficiário (Domenico Simoncelli); servidão (Coviello, Ferrini, Demolombe, Planiol); não faltam os que o associam à enfiteuse (Gianturco, Duranton). A verdade é que é despiciendo mobilizar todos estes velhos conceitos para a caracterização do condomínio edilício. É ele um fenômeno econômico e jurídico moderno. Não se compraz com os institutos invocados para sua explicação, nem deles necessita. Especialmente deve ser lembrado que, se fosse uma pessoa, o condomínio, como tal, é que seria o sujeito de todas as relações jurídicas. Não é isso que se verifica. Os titulares dos direitos, quer sobre as unidades autônomas, quer sobre as partes e coisas comuns, são os condôminos e não uma inexistente ou fictícia pessoa jurídica. O condomínio dito edilício explica-se por si mesmo. É uma modalidade nova de condomínio, resultante da conjugação orgânica e indissolúvel da propriedade exclusiva e da co-propriedade.[1] (grifei)
O Superior Tribunal de Justiça não destoa: ao julgar o Recurso Especial n.º 1.256.912/AL, em 07.02.2012, relator Ministro Humberto Martins, deixou assinalado que o Código Civil de 2002 não atribuiu ao condomínio a forma de pessoa jurídica, malgrado com a oportuna ressalva dos precedentes que reconhecem “referida personalidade jurídica para fins tributários.”[2]
A orientação administrativa do Tribunal de Justiça de São Paulo compartilha o mesmo entendimento: no entanto, ao descartar a personalidade jurídica do condomínio edilício, admite, excepcionalmente, que ele tem aptidão para adquirir imóveis, vale dizer, para ser titular de direito real, na hipótese versada no § 3.º do artigo 63 da Lei n.º 4.591/1964[3] e nos casos envolvendo alienação judicial de unidades autônomas pertencentes a condôminos inadimplentes.[4]
A questão restou bem sintetizada no julgamento da Apelação Cível n.º 880-6/7, ocorrido em 07.10.2008, relator Desembargador Ruy Camilo:
..., este Conselho Superior da Magistratura já firmou entendimento no sentido de que o condomínio, diversamente do sustentado pelo Recorrente, não tem personalidade jurídica. Como consequência, não se tem admitido possa o condomínio adquirir propriedade imóvel.
Trata-se, no tema, de regra geral, a qual, porém, comporta duas exceções, de interpretação estrita. A primeira delas está prevista no art. 63, § 3º, da Lei n. 4.591/1964, em que se afigura possível a aquisição de imóvel pelo condomínio diante da inadimplência do adquirente no pagamento do preço da construção. A segunda corresponde à hipótese de aquisição, em hasta pública, de unidade autônoma pelo condomínio, como forma de satisfazer o crédito decorrente do não pagamento, pelo condômino, das despesas condominiais, por força da aplicação analógica do disposto no referido art. 63, § 3º, da Lei n. 4.591/1964.
Nada obstante a situação enfrentada não se encaixe nas exceções mencionadas, convém suavizar ainda mais o rigor legal. Isto é, focada a instrumentalidade dos registros públicos e a atuação do condomínio edilício na vida negocial – participando de diversas operações econômicas como centro unitário de direitos e deveres –, impõe franquear-lhe a aquisição de imóveis em casos similares ao aqui examinado.
Em outras palavras: é razoável, também, permitir ao condomínio edilício a aquisição de bens imóveis direcionados à ampliação das vagas de estacionamento, voltados ao aumento da área de garagem, desde que autorizada pela unanimidade dos condôminos presentes em assembleia, revelada a pertinência da incorporação patrimonial, quando confrontada com atividade-fim do condomínio, e evidenciada a sua reversão em benefício de todos os condôminos.   
A solução mais se justifica quando considerada a noticiada imposição estatal e, portanto, o risco de sanção administrativa decorrente do número insuficiente de vagas para estacionamento, bem como os inconvenientes práticos que certamente adviriam da necessidade de obter o consentimento de todos os condôminos para formalização do negócio jurídico.
Em resumo: desautorizada, pela ordem jurídica, a irrestrita e incondicional atribuição de personalidade jurídica ao condomínio, contraindicada, também, em função da tutela do patrimônio dos condôminos minoritários[5], é de rigor, em contrapartida, dialogando com a realidade fática, combustível da vitalidade do direito, força viva em perene atualização, temperar a proibição legal.
Pelo todo exposto, insubsistentes, in concreto, as exigências, então atreladas à falta de personalidade jurídica do condomínio edilício, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro da escritura pública de venda e compra (fls. 51/54)
 
 
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator
 


[1]Instituições de Direito Civil: direitos reais. 20.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 161. v. IV. Caio Mário da Silva Pereira aborda o tema de forma exaustiva, mais aprofundada, em seu clássico Condomínio e Incorporações (10.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 75-96). João Batista Lopes expressa idêntica opinião doutrinária (Condomínio. 6.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 49-56).
[2]Conferir: Recurso Especial n.º 411.832/RS, relator Ministro Francisco Falcão, e Recurso Especial n.º 1.064.455/SP, relator Ministro Castro Meira, julgados em 18.10.2005 e 19.08.2008, respectivamente.
[3]Artigo 63. É lícito estipular no contrato, sem prejuízo de outras sanções, que a falta de pagamento, por parte do adquirente ou contratante, de 3 prestações do preço da construção, quer estabelecidas inicialmente, quer alteradas ou criadas posteriormente, quando for o caso, depois de prévia notificação com o prazo de 10 dias para purgação da mora, implique na rescisão do contrato, conforme nele se fixar, ou que, na falta de pagamento, pelo débito respondem os direitos à respectiva fração ideal de terreno e à parte construída adicionada, na forma abaixo estabelecida, se outra forma não fixar o contrato.
§ 1º. Se o débito não for liquidado no prazo de 10 dias, após solicitação da Comissão de Representantes, esta ficará, desde logo, de pleno direito, autorizada a efetuar, no prazo que fixar, em público leilão anunciado pela forma que o contrato previr, a venda, promessa de venda ou de cessão, ou a cessão da quota de terreno e correspondente parte construída e direitos, bem como a sub-rogação do contrato de construção.
(...).
§ 3º. No prazo de 24 horas após a realização do leilão final, o condomínio, por decisão unânime de Assembleia-Geral em condições de igualdade com terceiros, terá preferência na aquisição dos bens, caso em que serão adjudicados ao condomínio.
(...). (grifei)
[4]Apelação Cível n.º 273-6/7, Desembargador José Mário Antonio Cardinale, julgada em 13.01.2005; Apelação Cível n.º 363-6/8, Desembargador José Mário Antonio Cardinale, julgada em 18.08.2005; Apelação Cível n.º 880-6/7, Desembargador Ruy Camilo, julgada 07.10.2008; Apelação Cível n.º 885-6/0, Desembargador Ruy Camilo, julgada 07.10.2008; Apelação Cível n.º 1.184-6/8, Desembargador Luiz Tâmbara, julgada 13.10.2009. 
[5]A título exemplificativo, para desaconselhar a admissão incondicional da personalidade jurídica do condomínio edilício, Francisco Loureiro, sem ignorar situações pontuais que a justificam, refere-se a situações inadmissíveis como a aquisição de imóvel de campo e o ingresso em empreendimento de risco estranho à finalidade do condomínio, então deliberado pela maioria, de modo, contudo, a colocar em risco o patrimônio de todos condôminos minoritários (Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Ministro Cezar Peluso (coord.). 2.ª ed. São Paulo: Manole, 2008. p. 1298).   


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