Despachos/Pareceres/Decisões
98146201/2012
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DJ nº 0000981-46.2011.8.26.0486 - Apelação Cível
: 31/10/2012
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 0000981-46.2011.8.26.0486, da Comarca de QUATÁ, em que são apelantes MÁRCIO APARECIDO DE ANDRADE E OUTROS e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, ANTONIO AUGUSTO CORRÊA VIANNA, decano, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 02 de agosto de 2012.
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça
e Relator
Apelação Cível nº 0000981-46.2011.8.26.0486
Apelante: Márcio Aparecido de Andrade e outros
Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil da Pessoa Jurídica de Quatá
VOTO Nº 20.968
REGISTRO DE IMÓVEIS – Desmembramento – existência de certidão positiva apontando ação penal contra o antigo coproprietário por crime de dano – Óbice do art. 18, III, “c”, c.c. o § 2º, da Lei nº 6.766/79, não configurado diante da excepcionalidade do caso - Recurso provido.
Trata-se de apelação interposta por Márcio Aparecido de Andrade, Patrícia Dutra Galvão Andrade, José Carlos Gonçalves e Diva Aparecida da Silva Gonçalves objetivando a reforma da r sentença de fls. 191/193, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil da Pessoa de Quatá, e manteve a recusa do registro da desmembramento denominado “Jardim Central” a ser efetuado na matrícula nº 6.746, daquela Serventia de Imóveis, por entender não atendidas as exigências do art. 18, III, da Lei nº 6.766/79, especialmente a que diz respeito à apresentação de certidões negativas de ações penais relativas a crimes contra o patrimônio.
Alegam os apelantes que a norma do art. 18, III, da Lei nº 6.766/79, não é absoluta e deve ser interpretada de acordo com sua finalidade – e não de forma gramatical - , que a certidão positiva refere-se ao ex-proprietário de quem adquiriram o imóvel e que o delito constante da certidão – crime de dano – não é capaz de representar qualquer prejuízo aos futuros adquirentes dos lotes. Aduzem, ainda, que os precedentes citados na sentença não referem-se a situações que não guardam exata similitude com o caso em exame (fls. 195/201).
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 217/218).
É o relatório.
Não se desconhece a jurisprudência trazida na suscitação da dúvida, no parecer do Ministério Público de primeira instância e na r sentença recorrida, no sentido de que a existência de ação penal promovida contra aquele que, nos últimos 10 anos, tenha sido titular de domínio do imóvel objeto do loteamento ou do desmembramento, obsta o registro do respectivo projeto nos termos do art. 18, § 2º, da Lei nº 6.766/79 (Apelações Cíveis nºs 0078848-38.2009.8.26.0114; 31.760-0/0; 37525-0/1; e 856-6/8).
O caso em exame, porém, traz peculiaridades que não podem ser desconsideradas.
Os apelantes pretendem registrar o desmembramento denominado “Jardim Central” no imóvel objeto da matrícula nº 3.009, do Registro de Imóveis de Quatá.
O registro foi negado com fulcro no art. 18, III e § 2º, da Lei nº 6.766/79, porque a certidão penal do ex-coproprietário Emerson Alexandro de Menezes, titular da fração ideal correspondente a 3,125% do imóvel (R.02 da matrícula às fls. 47), aponta a existência de ação penal em andamento por crime de dano (certidão de objeto e pé e print do feito às fls. 13 e 15/16).
A Lei nº 6.766/76, ao arrolar a extensa lista de documentos que devem acompanhar o projeto de loteamento ou desmembramento apresentado a registro, tem por escopo preservar, de um lado, o rigoroso respeito aos aspectos urbanísticos que norteiam o parcelamento do solo e, de outro, a proteção à figura do adquirente (CSM Ap. Cível nº 31.760-0) .
No caso em exame, no entanto, é preciso observar que: a) a certidão positiva está em nome de um dos ex-coprietários da fração ideal do imóvel, Emerson Alexandro de Menezes, e não dos atuais titulares de domínio, ora apelantes; b) a fração ideal de que referida pessoa era titular correspondia a apenas 3,125% do imóvel; c) consta uma única ação penal contra Emerson Alexandro de Menezes, estando todas as demais certidões em ordem; d) a pena aplicada a Emerson Alexandro de Menezes em primeiro grau não oferece qualquer risco aos futuros adquirentes por consistir no pagamento de um salário mínimo e a 13 dias-multa; e) o delito em si nenhuma relação jurídica guarda com a natureza do desmembramento; f) já houve trânsito em julgado para o Ministério Público, de sorte que a pena não pode ser agravada; g) estão em ordem as demais certidões de todos os demais proprietários e ex-proprietários relativas aos tributos federais, estaduais e municipais incidentes sobre o imóvel, às ações e ônus reais referentes ao imóvel, às ações pessoais, às ações penais com respeito aos crimes contra o patrimônio e contra a Administração Pública e às serventias de protesto de títulos (fls. 50/145).
Esses fatos, examinados em conjunto, revelam que a interpretação fria e literal da Lei nº 6.766/79 poderia dar ensejo a equivocada recusa do título ora em exame.
Com efeito, a Lei nº 6.766/79, ao exigir certidões criminais dos titulares de domínio dos últimos dez anos, quis proteger os adquirentes de pessoas inescrupulosas, de má-fé, que possam, de qualquer forma, comprometer a higidez do loteamento ou desmembramento e prejudicar os futuros adquirentes.
No caso em questão, contudo, está-se diante de um ex-coprietário que tem contra si uma única condenação não transitada em julgado pela prática de crime de dano, cuja potencialidade lesiva aos futuros adquirentes é nenhuma haja vista o montante da pena aplicada: pagamento de um salário mínimo e 13 dias-multa.
Se assim é, atendida a finalidade maior da norma, de rigor o abandono da interpretação literal para se dar preferência à lógica, permitindo-se o registro do desmembramento, com o que se estará, ainda, atendendo à função social da propriedade.
Ante o exposto e diante da excepcionalidade do caso, pelo meu voto, dou provimento ao recurso.
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator
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