Despachos/Pareceres/Decisões
5413471/2011
:
Acórdão - DJ 990.10.541.347-1 - Apelação Cível
: 13/09/2011
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 990.10.541.347-1, da Comarca de JUNDIAÍ,em que é apelante IMPLEMENTOS YAMASHITA LTDA eapelado o 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do Desembargador Relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Desembargadores JOSÉ ROBERTO BEDRAN, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ SANTANA, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, ANTONIO LUIZ REIS KUNTZ, Decano, CIRO PINHEIRO E CAMPOS, LUIS ANTONIO GANZERLA, respectivamente, Presidentes da Seção Criminal e de Direito Público, e HAMILTON ELLIOT AKEL, Presidente da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça, em exercício.
São Paulo, 02 de junho de 2011.
(a) MAURÍCIO VIDIGAL
Corregedor Geral da Justiça e Relator
Apelação Cível nº 990.10.541347-1
Apelante: IMPLEMENTOS YAMASHITA LTDA.
Apelado: 1º. OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DE JUNDIAÍ
VOTO Nº 15.226
Registro de Imóveis - Dúvida julgada procedente - Negativa de registro de conferência de bens para integralização de imóveis ao capital social de empresa – Irresignação apenas parcial contra as exigências formuladas pelo Oficial que prejudica a dúvida e impede o acolhimento do recurso - Título que não descreve os imóveis integralizados – Irrelevância que o contrato social tenha sido celebrado antes da Lei 8.934/94 – Aplicabilidade do princípio “tempus regit actum” ao registro de imóveis – Sócio casado em regime de comunhão universal de bens – Integralização que, conquanto não exija escritura pública, depende da anuência do cônjuge – Recurso não provido.
Trata-se de dúvida suscitada pelo 1º. Oficial do Registro de Imóveis e Anexos de Jundiaí, a pedido de IMPLEMENTOS YAMASHITA LTDA. A apelante apresentou, no registro imobiliário, conferência de bens para integralização de capital social. O Oficial, feita a prenotação, recusou-se a promover o registro, por variadas razões: não consta do contrato social a indicação dos imóveis integralizados, com sua completa descrição e particularização; não foram apresentadas as guias de recolhimento do ITBI ou comprovação de isenção, com a indicação do valor venal dos imóveis; o sócio majoritário era casado em comunhão de bens, e a conferência só poderia ser feita por escritura pública; não há prova da identidade entre a interessada e a proprietária dos imóveis, denominada Yamashita Yukio – Implementos Yamashita “Impleya”; já houve o registro da escritura lavrada em 04 de abril de 1972; não há comprovação da titularidade do imóvel objeto da transcrição 82.775, já que a qualificação é precária e antiga; não há contrato social, alterações e atas da empresa em cujo nome os imóveis figuram; e não foi apresentada prova da nova confrontação do imóvel objeto da matrícula no. 108.665, já que pelo título aquisitivo ele não tem a frente voltada para a Avenida Prefeito Luis Latorre, como constou.
O MM. Juiz Corregedor Permanente acolheu as ponderações do Oficial do Registro de Imóveis e manteve a recusa do registro.
Inconformada com a respeitável decisão, interpôs a interessada, tempestivamente, o presente recurso. Alega que o contrato social foi celebrado antes da Lei 8.934/94, quando ainda vigorava a Lei 4.726/65, e não se exigia a caracterização e indicação dos imóveis conferidos. Acrescenta que não é possível exigir-se escritura pública, uma vez que o sócio e seu cônjuge já são falecidos. A conferência de bens para integralização de capital é isenta de ITBI, e “Implementos Yamashita Impleya” é apenas nome de fantasia da apelante.
A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 177/181).
É o relatório.
A interessada não impugnou todas as exigências do Oficial, demonstrando irresignação contra apenas algumas delas. Ao manifestar-se sobre a última – prova da nova confrontação do imóvel – a apelante limitou-se a dizer que “não se trata de uma dúvida, mas sim de um procedimento administrativo que será cumprido em seu devido tempo, até porque demanda providências da parte junto à municipalidade” (fls. 98).
A concordância parcial com as exigências do Oficial prejudica a dúvida, que só admite duas soluções: a determinação do registro do título protocolado e prenotado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava no momento em que surgida a dissensão entre a apresentante e o Oficial de Registro de Imóveis; ou a manutenção da recusa do Oficial. Ora, para que se possa decidir se o título pode ser registrado ou não é preciso que todas as exigências – e não apenas parte delas – sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior, como demonstra o julgamento da apelação cível no. 1.118-6/8, rel. Des. Ruy Camilo, de 30 de junho de 2009.
Mas, ainda por outras razões, o recurso não poderia ser provido.
A conferência de bens para integralização do capital social da empresa deve observar o princípio da especialidade objetiva. Este Conselho Superior da Magistratura já teve oportunidade de decidir, na Ap. Civ. 074978-0/9, de 03/04/2001, rel. Des. Luís de Macedo que:
“Conferência de bens - transcrição - inexatidão - especialidade - impossibilidade de registro
Dúvida julgada procedente. SABESP. Conferência de bens realizada pela Fazenda do Estado. Transcrição antiga e lacunosa. Inexatidão quanto aos limites perimetrais dos imóveis. Princípio da especialidade. Registro inviável. Recurso a que se nega provimento”.
Ora, o contrato social (fls. 39) não indica quais são os imóveis conferidos, nem fornece uma descrição que permita identificá-los. Menciona apenas que haverá o “aproveitamento relativo ao capital subscrito e integralizado na firma que é titular, conforme arquivamento na Junta Comercial do Estado de São Paulo...”. Embora o art. 64 da Lei 8.934/94 autorize a conferência por meio de certidão da Junta Comercial, não se dispensa a observância ao princípio da especialidade.
Conquanto o contrato tenha sido celebrado em 1977, antes da vigência da Lei 8.934/94, o registro só foi postulado agora. E, por força do princípio do “tempus regit actum”, os requisitos do registro devem estar preenchidos na data da prenotação, pois como ficou decidido na apelação cível 530-6/0, de 20/07/2006, rel. Des. Gilberto Passos de Freitas:
“Compromisso particular de venda e compra - CND do INSS e Receita Federal – tempus regit actum – exigibilidade - Registro de Imóveis - Dúvida - Compromisso particular de venda e compra anterior à edição da Lei 8.212/91 - Irrelevância - Aplicação da lei vigente ao tempo do registro - Exigência decorrente do disposto nos artigos 47 e 48 - Sentença mantida - Recurso não provido”.
O ITBI não é mesmo de ser exigido, diante do que dispõe o art. 156, par. 2º., inciso I, da Constituição Federal, reproduzido pelo art. 139 da Lei Complementar 460, de 22 de outubro de 2008, da Comarca de Jundiaí, uma vez que a apelante não se encontra entre as exceções previstas na legislação, pois não comercializa, nem loca ou arrenda bens imóveis, como mostra o seu contrato social.
A apelante informa (fls. 93, item 39), que o sócio Yamashita Yukio constituiu a empresa Yamashita Yukio-ME, transferindo-lhe os bens, em 1950. Do teor da impugnação, depreende-se que ele, de fato, era casado. Assim, se os bens foram adquiridos após o casamento, a esposa era co-proprietária, sendo indispensável a sua anuência, para a transferência de bens. O Oficial, na nota de devolução, exigiu que fosse lavrada escritura pública, já que a esposa não era sócia, invocando, como precedente, a apelação cível no. 626-6/9. Mas este Egrégio Conselho Superior da Magistratura modificou o entendimento anterior a respeito do tema, na apelação cível 1.129-6/8, de 30 de junho de 2009, Rel. Des. Ruy Camilo, em que ficou assentado:
“Casados os cônjuges pelo regime da comunhão universal de bens, é de se concluir, em face do art. 1.647, I, do Código Civil, que, com outorga uxória, a alienação de imóvel (mesmo comum) pelo marido para que passe a integrar capital social, como neste caso, é viável.
Categórico, por seu turno, o art. 64 da Lei nº 8.934/94, ao dispensar escritura pública na hipótese por ele contemplada: “A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social”.
O título apresentado, portanto, se mostra adequado para a finalidade pretendida.
Resta a discussão acerca da possibilidade de constar a autorização da mulher do próprio instrumento de alteração contratual. E esta possibilidade deve ser reconhecida à luz do ordenamento jurídico vigente.
Com efeito, dispõe, com clareza, o art. 220 do Código Civil: “A anuência ou a autorização de outrem, necessária à validade de um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que se possa, do próprio instrumento”.
Diante de norma tão objetiva, que se ajusta com perfeição ao caso em tela, nenhuma dúvida remanesce. Patente o cabimento, na peculiar hipótese em exame, da inserção da outorga uxória no “próprio instrumento” particular em que previsto o incremento de capital, não se afigurando exigível escritura pública apenas para tal finalidade.
Em que pese, pois, entendimento anterior deste Conselho, é de se admitir o registro pretendido, como corolário das regras legais analisadas”.
Mas, ainda que inexigível a escritura, a conferência para integralização do capital demandava ao menos a anuência do cônjuge, no próprio instrumento em que efetivada. E a esposa do sócio não anuiu, como se verifica no documento de fls. 39/41.
Também não há elementos de convicção que permitam concluir que a apelante e a empresa Yamashita Yukio – Implementos Yamashita “Impleya” são a mesma pessoa jurídica, sendo este último apenas o nome de fantasia. O CGC indicado por esta última a fls. 36 coincide com o da empresa Yamashita Yukio – ME, que integralizou o capital social da apelante, conforme contrato de fls. 39. Mas não há provas de que coincida com o da apelante, que não se confunde com a microempresa que participou de sua constituição. Não consta, nem do contrato social, nem das alterações, alusão ao nome de fantasia, o que traz dúvida razoável sobre a identidade entre as duas empresas.
Por fim, a certidão de fls. 31 comprova que a identificação do proprietário Yukio Yamashita é mesmo antiga e precária, a exigir cuidados especiais, sobretudo para afastar eventual perigo de homonímia. Feita em 1970, a transcrição não contém os requisitos hoje exigidos pela Lei 6.015/73, sendo razoável exigir-se da interessada que traga os documentos solicitados pelo Oficial, que servirão para melhor esclarecer a titularidade do bem.
Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, nego provimento ao recurso.
(a) MAURÍCIO VIDIGAL
Corregedor Geral da Justiça e Relator
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