Despachos/Pareceres/Decisões
9901024/2010
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Acórdão - DJ 990.10.024.652-6 - apelação cível
: 14/09/2010
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 990.10.024.652-6, da Comarca de PRESIDENTE PRUDENTE, em que é apelante MERCEDES TICIANELLI MATIUSO eapelado o 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em julgar prejudicada a dúvida e não conhecer do recurso, de conformidade com o voto do Desembargador Relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Desembargadores VIANA SANTOS, Presidente do Tribunal de Justiça, REIS KUNTZ, Revisor Convocado, LUIZ TÂMBARA, Decano, CIRO CAMPOS, LUIS GANZERLA e MAIA DA CUNHA, respectivamente, Presidentes da Seção Criminal, de Direito Público e de Direito Privado do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 30 de junho de 2010.
(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Formal de partilha – Ausência de título original – Matéria prejudicial – Observação, todavia, de que o cancelamento de averbação de indisponibilidade se faz, em regra, por outro ato de averbação (Lei nº 6.015/73, art. 248) – Pretensão baseada em alegação de nulidade, para cuja decretação, porém, é preciso que sejam ouvidos os atingidos, entre os quais, in casu, a União Federal (Lei nº 6.015/73, art. 214, § 1º) – Necessidade de procedimento próprio, perante a Corregedoria Permanente, que não é o de dúvida, por se tratar de ato de averbação – Ou, então, de que a discussão se faça na esfera jurisdicional, visto que a indisponibilidade decorre de ação revocatória – Recurso não conhecido.
Cuida-se de apelação interposta por Mercedes Ticianelli Matiuso contra sentença (fls. 33/36) que, em procedimento de dúvida, manteve a negativa do 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Presidente Prudente ao registro de formal de partilha, oriundo do inventário dos bens de Nadir Matiuso, recusa esta fundada na existência, na matrícula respectiva (nº 26.608), de averbação de indisponibilidade.
Nas razões recursais, a apelante sustenta, em síntese, que o imóvel da matrícula nº 26.608 era de propriedade de Osmar Capucci e sua mulher, quando averbada a primeira determinação judicial de indisponibilidade, decorrente de ação revocatória movida pela União Federal (AV-3). Posteriormente, pelo mesmo Juízo Federal, conforme averbação nº 4 (AV-4), foi levantada tal indisponibilidade. Então, nos termos do registro nº 5 (R-5), o domínio do bem foi transferido, por dação em pagamento, a Nadir Matiuso (hoje falecido) e sua mulher Mercedes Ticianelli Matiuso (ora recorrente). Por fim, restabelecida a indisponibilidade pelo Tribunal Regional Federal da 3º Região, como consta da averbação nº 6 (AV-6), com base nela foi recusado o registro do formal de partilha extraído do inventário de Nadir. Afirma a apelante que esta última averbação é nula, pois fere o princípio da continuidade, uma vez que, quando realizada, o imóvel não mais estava registrado em nome dos réus na ação revocatória. Assevera que a averbação nº 6 (AV-6) é “ATO NULO” e que “através deste procedimento de dúvida deve ser ‘CANCELADA’, a fim de que o título (formal de partilha)” possa ingressar. Para tanto, requer provimento (fls. 41/47).
Sob a ótica da douta Procuradoria Geral de Justiça, o apelo não deve ser conhecido, pois “o procedimento de dúvida, de natureza administrativa e em que se aprecia ato de registro em sentido estrito, não se presta a discutir a viabilidade ou não de cancelamento de averbação, por nulidade de pleno direito. A hipótese comportaria apreciação em sede adequada, devidamente instaurada para esse fim ser, e não a reboque de procedimento de suscitação de dúvida”. Além disto, conquanto a interessada “tenha requerido a suscitação de dúvida, não apresentou o título em seu original, com o que desatendeu o disposto no artigo 198 e ss., da LRP”, configurando-se questão prejudicial. No mérito, entende que a indisponibilidade impeditiva do registro é “decorrente de decisão judicial proferida em processo contencioso” e “a discussão sobre sua validade ou não deve ser suscitada na via adequada, não comportando apreciação em sede de procedimento de dúvida, de natureza eminentemente administrativa”. Postula, “em preliminar, o não conhecimento do recurso, considerando a dúvida prejudicada e, no substancial, o não provimento do reclamo” (fls. 55/60).
É o relatório.
Imperioso reconhecer que, no presente caso concreto, não se acha preenchido requisito essencial e indispensável para que a dúvida possa, sequer, ser conhecida como tal.
Verifica-se, com efeito, que aos autos não foi trazido o título original, como seria de rigor. Devolvido este à interessada (fls. 05), percebe-se que não se encontra anexado ao pedido de suscitação de dúvida que veio a ser formulado por ela (fls. 06/166vº).
Contrariada, pois, a norma do artigo 198 da Lei nº 6.015/73, em que se exige, na hipótese de dúvida, que “o título” seja “remetido ao juízo competente para dirimi-la”.
De solar clareza a respeito, outrossim, o item 30 do capítulo XX das Normas de Serviços da E. Corregedoria Geral da Justiça, segundo o qual, “não se conformando o apresentante com a exigência, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao Juízo competente para dirimi-la”. O próprio título, portanto. Porém, neste caso concreto, a interessada, embora insistindo no registro e na suscitação de dúvida, não reapresentou o formal de partilha.
Como se tem decidido, a ausência do título original configura fato que não autoriza o exame do mérito.
Acerca de hipóteses quejandas este Conselho tem posição firmada, da qual é representativo o V. Acórdão proferido na Apelação Cível nº 43.728-0/7, da Comarca de Batatais, publicado D.O.E., Poder Judiciário, Caderno I, Parte I, de 13 de outubro de 1998, página 04, e relatado pelo eminente Des. Sérgio Augusto Nigro Conceição. Eis sua ementa:
“REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida inversamente suscitada - Falta do título original e de prenotação - Inadmissibilidade - Prejudicialidade - Recurso não conhecido”.
O texto do julgado, no qual há referência a outro precedente, é esclarecedor:
“Pacífica a jurisprudência deste Colendo Conselho Superior da Magistratura no sentido da necessidade de apresentação do título original, como decidido na apelação cível n.º 30.728-0/7. da Comarca de Ribeirão Preto, Relator o Desembargador Márcio Martins Bonilha, nos seguintes termos: ‘Ora, sem a apresentação do título original, não admite a discussão do quanto mais se venha a deduzir nos autos, porque o registro, em hipótese alguma, poderá ser autorizado, nos termos do artigo 203, II, da Lei 6.015/73. Não é demasiado observar que no tocante à exigência de autenticidade, o requisito da exibição imediata do original diz respeito ao direito obtido com a prenotação do título, direito que não enseja prazo reflexo de saneamento extrajudicial de deficiências da documentação apresentada’ ”.
Conclui-se:
“Não tendo sido mantido nos autos, no original, nem oportunamente prenotado, o título cujo registro pretende a recorrente, não é de ser conhecido o recurso, prejudicadas as demais questões suscitadas pelas partes”.
Imprescindível, deveras, em situações como a presente, o exame material do próprio título original, não apenas para que se venha a ter certeza de sua autenticidade e regularidade, mas, ainda, para que, caso autorizado o registro, este possa efetivamente se concretizar. Do contrário, tal concretização dependeria de evento futuro e incerto, consistente na apresentação, ao registrador, daquele original faltante. Ou seja, este Conselho Superior estaria a proferir decisão condicionada.
A ausência do requisito supra mencionado prejudica a dúvida e, ipso facto, o recurso interposto.
Por outro lado, ainda que assim não fosse, inviável se afiguraria dar guarida, neste procedimento de dúvida, à pretensão apresentada. Oportuno observar que o cancelamento de averbação de indisponibilidade se faz, em regra, por outro ato de averbação (Lei nº 6.015/73, art. 248). Ademais, o pleito de cancelamento formulado se baseia em alegação de nulidade, para cuja decretação é preciso que sejam “ouvidos os atingidos”, entre os quais, in casu, a União Federal (Lei nº 6.015/73, art. 214, § 1º), como se vê na averbação nº 6 (fls. 04vº). Daí a necessidade, para discussão da matéria, de procedimento próprio, perante a Corregedoria Permanente, que não é o de dúvida, por se almejar ato de averbação, destinado a cancelar outra averbação.
Note-se, finalmente, que a indisponibilidade em tela decorre, conforme averbado (AV-6), de “ação revocatória”, sendo que nos presentes autos não há elementos para se saber se, naquela, chegou a haver decisão acerca da eficácia ou validade da transmissão de domínio contemplada no registro nº 5 (R-5) da matrícula nº 26.608 (fls. 04vº). De qualquer modo, mostra-se possível, também, que a discussão venha a ser travada na esfera jurisdicional, lembrando-se que o procedimento de dúvida é de feição administrativa.
Diante do exposto, dou por prejudicada a dúvida e não conheço do recurso.
(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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