Despachos/Pareceres/Decisões
124064/2010
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ACÓRDÃO _ DJ 1.240-6/4
: 07/05/2010
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.240-6/4, da Comarca da CAPITAL, em que é apelante RITA APPARECIDA OLIVA VILLELA eapelado o 7º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS da referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar parcial provimento ao recurso, de conformidade com os votos do Desembargador Relator e do Desembargador Revisor que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores MARCO CÉSAR MÜLLER VALENTE, Presidente do Tribunal de Justiça, em exercício, e REIS KUNTZ, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, em exercício.
São Paulo, 16 de março de 2010.
(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS – Recusa ao registro de dois títulos: Carta de Adjudicação extraída de arrolamento de bens por falecimento e Formal de Partilha oriundo de outro arrolamento – Encadeamento de tais títulos, que faz do ingresso do primeiro pressuposto para o registro do segundo – Possibilidade de qualificação de títulos judiciais pelo registrador – Negativa de ingresso da Carta de Sentença fundada na ausência de cabal demonstração da identidade entre a autora da herança e a titular tabular – Recusa do Formal de Partilha porque menciona transferência da totalidade do domínio do imóvel, quando há titularidade, apenas, sobre uma parte ideal – Dúvida julgada procedente – Parcial provimento ao recurso, para admitir o registro, apenas, da Carta de Adjudicação, uma vez que suficientemente identificada a pessoa em tela.
Cuida-se de apelação interposta por Rita Apparecida Oliva Villela contra sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 7º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, o qual negou o registro, na matrícula nº 153.940, de dois títulos: Carta de Adjudicação extraída de arrolamento de bens por falecimento e Formal de Partilha oriundo de outro arrolamento de bens por morte. Vislumbrou-se o encadeamento de tais títulos, que faz do ingresso do primeiro pressuposto para o registro do segundo. Baseou-se a recusa da Carta de Sentença na ausência de demonstração cabal da identidade entre a autora da herança e a titular tabular. Foi, outrossim, recusado o Formal de Partilha porque menciona transferência da totalidade do domínio do imóvel, quando há titularidade, apenas, sobre uma parte ideal de 5,0809%.
Alega a apelante que a Carta de Adjudicação foi passada em 1970, antes do advento da Lei nº 6.015/73, “não havendo dúvida quanto às partes constantes do título”. Sustenta que os dois títulos são judiciais e, portanto, já houve análise do Poder Judiciário. Postula, outrossim, quanto à incorreção no Formal de Partilha acerca da descrição do bem (parte ideal), “que seja desconsiderado tal erro, pois este é evidente” (sic). Requer o acolhimento do pleito recursal, para obtenção do registro de ambos os títulos (fls. 208/212).
Para o Ministério Público, o recurso não merece provimento, cabendo a manutenção da recusa enunciada (fls. 219/222).
É o relatório.
Convém anotar, inicialmente, que pacífico se mostra o posicionamento deste Conselho no sentido de que a origem judicial dos títulos não exclui a qualificação registrária, a qual o responsável pelo serviço delegado está obrigado a levar a efeito.
Tal orientação se coaduna com o teor do item 106 do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, segundo o qual “incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.
Certo, também, que há de ser observada a legislação vigente ao tempo da apresentação.
No caso presente, todavia, verifica-se que o ingresso da Carta de Adjudicação, em que pese a cautela do registrador, não representará ofensa aos princípios da continuidade e da especialidade subjetiva, pois é possível, sim, a induvidosa identificação da autora da herança, falecida nos idos de 1946 (fls. 23 e 29), com a pessoa de mesmo nome figurante na matrícula como titular da parte ideal em tela (5,0809%).
Demonstra-o o teor da manifestação do próprio Oficial, ao suscitar a dúvida: “a autora da herança que na Carta de Adjudicação figura com o nome de APARECIDA DA CRUZ, qualificada simplesmente como sendo solteira, filha das primeiras núpcias de João da Cruz, que também se assina João Valentim da Cruz e Dolores Comino Repulho, na aludida matrícula nº 153.940, por transporte dos dados da transcrição aquisitiva de nº 16.869, figura apenas como APARECIDA, filha de Dolores Comino Repulho e João Valentim da Cruz” (fls. 03).
Ora, mesmo à luz da legislação presente, cumpre relembrar que o falecimento se deu em 1946, época em que não se cogitava de documentos de identificação pessoal com os padrões atuais (notadamente numeração de Cadastro das Pessoas Físicas – CPF). O que a lei exige, para garantia da continuidade e da especialidade subjetiva, quanto à pessoa cujos direitos são transferidos, é que, confrontado o registro com o título, não paire dúvida a respeito de sua identidade. E dúvida não ocorre aqui. Bem se percebe a clara coincidência de nome e de filiação, valendo observar, inclusive, que o nome da mãe é bastante incomum.
Admissível, pois, o ingresso da Carta de Adjudicação, anotando-se que o registrador consignou a possibilidade de ficar “para data oportuna a regularização da averbação da construção, o que não prejudica, s.m.j., o registro” (fls. 05).
Igual solução não é possível, contudo, no que tange ao outro título. A própria apelante admite a existência de erro no Formal de Partilha. Dele consta a transferência da totalidade do domínio do imóvel, quando há titularidade, apenas, sobre uma parte ideal de 5,0809%. Limita-se a recorrente a pedir “que seja desconsiderado tal erro, pois este é evidente” (fls. 211).
Por óbvio, essa singela desconsideração não se mostra viável, pois requisito inarredável para o ingresso do título é a coincidência entre seu objeto e o conteúdo do registro. Isto sob pena de violação, agora sim, dos princípios da especialidade, da continuidade e da disponibilidade. É imperioso que o bem esteja corretamente descrito; que haja identidade de descrição e características na comparação entre título e matrícula; que, graças a esta coincidência, se assegure o encadeamento continuado entre o registro anterior e o subseqüente; bem como que nunca se transfira mais do que se tem (nemo dat quod non habet).
Concluído, assim, que, recusados dois títulos, um deles merece acesso ao fólio real, o apelo deve ser parcialmente provido.
Diante do exposto, mantendo a negativa ao ingresso do Formal de Partilha, dou parcial provimento ao recurso, para admitir o registro, apenas, da Carta de Adjudicação.
(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
1. Trata-se de recurso interposto por Rita Apparecida Oliva Villela contra a r. sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo 7º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, recusando o registro de carta de adjudicação e de formal de partilha, extraídos de arrolamentos de bens diversos, na matrícula nº 153.940.
Sustenta a recorrente, em suma, que passaram a Carta de Adjudicação em 1970, anteriormente ao advento da Lei 6.015/73, e que não havia dúvida quanto às partes que constavam do título. Aduz que ambos os títulos são judiciais e, portanto, já foram analisados pelo Poder Judiciário. Pede que, por ser evidente, seja desconsiderado o erro referente a descrição do bem (parte ideal) no Formal de Partilha. Por fim, requer seja acolhido o recurso, com o consequente registro dos títulos.
A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso.
É o breve relatório.
Acompanho o nobre Relator, o recurso comporta parcial provimento, conforme ressaltou.
De proêmio, cumpre consignar que não obstante cuidar-se de títulos judiciais, para que estes tenham ingresso no fólio real é imprescindível a sua qualificação registrária, conforme precedentes jurisprudenciais.
Com efeito, nota-se que, no caso sub examen, o registro da Carta de Adjudicação não representa ofensa aos princípios da continuidade e da especialidade, pois, de acordo com os documentos constantes dos autos, identifica-se, de forma inequívoca, a autora da herança, com a pessoa que figura na matrícula como titular da parte ideal em comento. Assim, pode-se admitir o registro da Carta de Adjudicação no fólio real, atentando que foi consignado pelo próprio registrador, a possibilidade de regularizar-se a averbação da construção, em momento oportuno.
Entretanto, o registro do Formal de Partilha não pode ser admitido. De fato, a própria apelante reconheceu a existência de equívoco no Formal de Partilha, consistente na transferência da totalidade do domínio do imóvel e não apenas sobre a parte ideal de que há titularidade. Desse modo, não há como se desconsiderar tal erro, sendo imprescindível a perfeita descrição do bem, para que o registro possa ser realizado, sob pena de violação aos princípios da especialidade, da continuidade e da disponibilidade.
Desse modo, não se poderia adotar solução diversa da oferecida pelo ilustre Relator, segundo anotado.
2. Recurso parcialmente provido – Dúvida julgada procedente – Registros de Carta de Adjudicação e de Formal de Partilha oriundos de arrolamentos diversos – Possibilidade do registro da Carta de Adjudicação, pois inequívoca a identificação entre a autora da herança e a titular tabular – Recusa do registro do Formal de Partilha, sob pena de violação aos princípios da especialidade, da continuidade e da disponibilidade.
(a) MARCO CÉSAR MÜLLER VALENTE, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça
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