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Despachos/Pareceres/Decisões 49863/2006


Acórdão _ DJ 498-6/3
: 26/03/2009

    A C Ó R D Ã O
 
    Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 498-6/3, da Comarca da CAPITAL, em que são apelantes o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e KATERINA HANA BARTON e apelados KATERINA HANA BARTON e o 13º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS da mesma Comarca.
 
    ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, em dar provimento ao recurso ministerial, prejudicado o adesivo, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado, vencido o 3º Juiz, que negava provimento a ambos os recursos.
 
    Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores CELSO LUIZ LIMONGI, Presidente do Tribunal de Justiça e CAIO EDUARDO CANGUÇU DE ALMEIDA, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
 
    São Paulo, 23 de março de 2006.
 
    (a)GILBERTO PASSOS DE FREITAS, Corregedor Geral da Justiça e Relator
 
    V O T O
 
    REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida improcedente – Apelação e recurso adesivo – Escritura de doação – Doadora que figura no registro como casada pelo regime da separação de bens e, na escritura, como viúva – Aquisição onerosa da doadora e óbito de seu ex-esposo ao tempo da vigência do Código Civil de 1916 - Aplicação do artigo 259 do Código Civil antigo, conforme a orientação jurisprudencial consolidada (Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal), nada obstante realizado o casamento no exterior, com regime da separação de bens segundo a lei estrangeira – Necessidade de prévia partilha do bem ou, diante de cessão de direitos hereditários, de adjudicação no juízo do inventário, em respeito ao princípio de continuidade – Apelação provida - Recurso adesivo prejudicado.
 
    1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, bem como de recurso adesivo interposto por Katerina Hana Barton, ambos contra r. sentença (fls. 41/43) que julgou improcedente dúvida suscitada pelo Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital, afastando o óbice ao registro de escritura pública de doação do imóvel objeto da transcrição nº 37.457 daquela Serventia Predial, com observação e “desde que seja feito o registro do inventário do extinto” esposo da apelante.
 
    O título foi recusado ao registro porque a doadora Katerina Hana Barton adquiriu o imóvel no estado de casada com Henrique Barton (falecido em 18.11.1986) no regime da separação legal de bens e, assim, diante do teor da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, necessário o prévio registro do formal de partilha ou a doação outorgada pelo Espólio, devidamente autorizado por alvará. 
 
    O Ministério Público sustenta, em suma, em seu apelo tempestivo, que a dúvida procede e o registro é inviável: a) primeiro, porque houve comunicação do bem entre os cônjuges, considerando a aquisição e o falecimento do varão sob o regime jurídico do Código Civil de 1916, bem como o enunciado da Súmula nº 377 do Egrégio Supremo Tribunal Federal; b) segundo, porque incabível a sentença de improcedência da dúvida na forma condicionada. 
 
    Katerina Hana Barton, por sua vez, nas razões de seu recurso adesivo, apresentado no prazo da resposta à apelação do Ministério Público, pugna pelo afastamento da determinação de registro do inventário de seu falecido marido, para que não haja impedimento algum ao registro da doação, argumentando, em síntese, que o casamento foi realizado na Tchecoslováquia, no regime legal da separação de bens, e, assim, aplicável o artigo 7º, § 4º, da Lei de Introdução ao Código Civil, observando que só fizeram parte do inventário do falecido os bens próprios dele, não aquele doado, de propriedade exclusiva da apelante, bem como que não se justifica, no caso, a aplicação do artigo 259 do Código Civil de 1916 e da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, que não mais refletem a realidade social.
 
    A Procuradoria Geral de Justiça opina pelo provimento do apelo principal do Ministério Público, dando por prejudicado o recurso adesivo de Katerina Hana Barton (fls. 84/89).
 
    É o relatório.
 
    2. Apresentado ao registro imobiliário escritura pública em que Katerina Hana Barton, viúva, doa para Stefanie Barton e Thomas Barton, o imóvel objeto da transcrição nº 37.457 do 13º Registro de Imóveis da Capital (fls. 10/11), observando-se que na referida transcrição, de 08 de setembro de 1972, consta que a doadora, casada pelo regime da separação de bens com Henrique Barton, adquiriu o imóvel por escritura de compra e venda de 07 de abril de 1972 (fls. 19).
 
    Outrossim, ainda há notícia de que Katerina Hana Barton e Henrique Barton casaram-se em Praga, Tchecoslováquia, sob o regime legal (à época do matrimônio) da separação de bens (fls. 21), bem como que Henrique faleceu em 18 de novembro de 1986 (fls. 14).
 
    Quanto à exigência de apresentação de certidão de casamento e escritura de pacto antenupcial registrado (fls. 20), formulada por ocasião da primeira apresentação da escritura de doação à Serventia Predial, está superada até porque sequer repetida por ocasião das exigências subseqüentes (fls. 22 e 23), que refletem óbice ao registro por razão diversa, a saber: “a teor da súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, apresentar para exame, qualificação e, se o caso, registro, o formal de partilha de Henrique Barton, ou, então, a doação outorgada pelo Espólio, devidamente autorizado por alvará”. 
 
    Diante daqueles fatos e desse óbice levantado pelo oficial registrador, não há como deixar de reconhecer a procedência da dúvida levantada, situação essa que resulta na procedência do recurso ministerial.  
 
    Com efeito, a tendência do Conselho Superior da Magistratura é no sentido de que a matéria pertinente à interpretação da disposição da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal deve ser considerada na esfera administrativa da qualificação registrária (e daí na requalificação que se opera no âmbito da dúvida), para reconhecer a presunção de comunicação de bem adquirido, a título oneroso, na constância do casamento, em situação de regime de separação legal (sem pacto antenupcial instituidor da separação pura, total e absoluta, ou prova de que seja produto de sub-rogação de bens anteriores ao enlace), admitindo-se a quebra dessa presunção apenas por decisão proferida pelo juízo competente, no exercício da função jurisdicional: Apelação Cível nº 9.954-0, Comarca de Araraquara, j. 29.05.1989, rel. Des. Álvaro Martiniano de Azevedo; Apelação Cível nº 11.156-0/7, Comarca de Campinas, j. 21.05.1990, rel. Des. Onei Raphael; Apelação Cível nº 029448-0/6, Comarca da Capital, j. 31.05.1996, rel. Des. Márcio Martins Bonilha; Apelação Cível nº 083.199.0/4-00, Comarca de Bauru, j. 27.12.2001, rel. Des. Luís de Macedo; Apelação Cível nº 094.159.0/8-00, Comarca da Capital, j. 20.09.2002, rel. Des. Luiz Tâmbara; Apelação Cível nº 000.376.6/7-00, Capital, j. 06.10.2005, rel. Des. José Mario Antonio Cardinale.
 
   Ademais essa interpretação não é criação jurisprudencial carente de suporte normativo, mas é fruto da inteligência do artigo 259 do Código Civil de 1916, repita-se, sintetizada na referida Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, que, em sede registrária, termina refletida na necessidade de respeito ao princípio de continuidade (artigo 195 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973).
 
    Afinal, presumida a comunicação dos bens, “com a morte de um dos cônjuges abre-se o estado de indivisão a que se submetem os bens que integravam o seu patrimônio, o que somente será solucionado com o julgamento da partilha dos bens deixados pelo morto, ou seja, com a decisão do juízo competente relativa à partilha, na qual se possa verificar quais os bens que a integraram e quais aqueles dela excluídos, questões de ordem fática e jurídica que somente podem ser resolvidas na via judicial, vedada qualquer análise probatória no campo administrativo. Essa decisão deverá, por fim, ingressar regularmente no fólio real, para que então sejam disponibilizados os imóveis, cabendo ao registrador apenas a regular qualificação do título para verificação do atendimento aos princípios registrários, sob o estrito ângulo da regularidade formal” (Apelação Cível nº 083.199.0/4-00, Comarca de Bauru, j. 27.12.2001, rel. Des. Luís de Macedo). 
 
    Não se diga que, por se cuidar de casamento ocorrido em Praga (Tchecoslováquia), sob o regime da separação de bens segundo a lei estrangeira, haveria violação ao artigo 7º, § 4º, da Lei de Introdução ao Código Civil, ou, ainda, que o caso escaparia à incidência do artigo 259 do Código Civil de 1916 e ao anunciado da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal.
 
    Ao contrário, conforme ficou bem esclarecido no julgamento da Apelação Cível nº 000.376.6/7-00, Capital, j. 06.10.2005, rel. Des. José Mario Antonio Cardinale, em caso similar ao presente (casamento realizado no exterior, sob o regime legal da separação de bens segundo a lei estrangeira) - quer em atenção aos precedentes históricos que resultaram na Súmula nº 377 do STF (atrelados às situações de estrangeiros, especialmente italianos, consoante doutrina de Silvio Rodrigues, in O Direito na Década de 80, Estudos Jurídicos em Homenagem a Hely Lopes Meirelles), quer em atenção a precedente do Egrégio Supremo Tribunal Federal (RE 78.811-GB, relator Min. Antonio Neder, in RTJ 74/96) -, “a tese adotada por esse Conselho no sentido de se adotar na esfera administrativa a Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal como regra, deve também se estender aos casos de estrangeiros casados no exterior sob o regime da separação de bens”.
 
    E assim é por força do prescrito no artigo 259 do Código Civil de 1916 (lei em vigor ao tempo da aquisição do imóvel em foco e ao tempo do óbito do esposo da apelante), pouco importando a origem estrangeira do casal e a celebração do casamento pelo regime da separação de bens segundo a lei estrangeira, pois “no pormenor da comunhão dos aqüestos, o importante e decisivo é o esforço comum e construtivo desenvolvido pelo casal no domicílio em que ele construiu e formou o patrimônio pelo trabalho constante e conjugado do marido e da mulher” (STF RE 78.811-GB, relator Min. Antonio Neder, in RTJ 74/96).
 
    Limitar a incidência do artigo 259 do Código Civil de 1916, consoante jurisprudência consolidada na Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, apenas para admitir comunicação à esposa em aquisições só em nome do varão (afastando-se comunicação ao esposo nas aquisições só em nome da virago), importa não só em falta de razoabilidade jurídica por quebra de isonomia, mas também ofende ao princípio constitucional de igualdade em direitos e obrigações entre homens e mulheres (artigos 5º, I, e 226, § 5º, ambos da Constituição da República).
 
    Mesmo diante da notícia de cessão de direitos hereditários em favor da apelante (fls. 34/35), não se pode deixar de exigir o prévio registro da carta de adjudicação à viúva-cessionária, com menção expressa ao bem imóvel em foco, para o necessário encadeamento de titularidades, em respeito ao princípio de continuidade, situação essa que também obsta, para o momento, o registro da escritura de doação e necessariamente conduz a procedência da dúvida, uma vez que é “inadmissível julgamento condicional” (CSM, Ap. Cív. 17.628-0/2, Comarca de Bauru, j. 06.08.1993, rel. Des. José Alberto Weiss de Andrade).
 
    Por fim, sabe-se que é preciso estar atento à dialética entre norma e vida, para que aquela não sufoque esta nem esta dissolva-se num caos; sabe-se, ainda, que todo juízo de prudência parte de uma virtude intelectual prática que considere o agir humano concreto, em sua máxima particularidade e, daí, com atenção à realidade pessoal e social em que se busca atingir o justo. Todavia, juízo que se aparta da lei falha, especialmente em sede de qualificação registrária cujo norte maior é a segurança jurídica formal pela publicidade das situações jurídicas certas, que exige denso respeito aos ditames legais e aos princípios de registro imobiliário.
 
    Logo, procedente o recurso de apelação e prejudicado o recurso adesivo.
 
    Pelo exposto, dou provimento à apelação do Ministério Público para julgar procedente a dúvida, mantendo a negativa de registro e, por conseqüência, dou por prejudicado o recurso adesivo de Katerina Hana Barton.
 
    (a) GILBERTO PASSOS DE FREITAS ,Corregedor Geral da Justiça e Relator
 


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