Despachos/Pareceres/Decisões
37269/2005
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ACÓRDÃO _ DJ 372-6/9
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 372-6/9, da Comarca de PATROCÍNIO PAULISTA, em que é apelante FRANCISCO MACEDO NETTO e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 06 de outubro de 2005.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
Registro de imóveis - Dúvida julgada procedente - Separação judicial - Partilha - Atribuição a cada um dos cônjuges, com exclusividade, de imóveis que integravam os bens tidos em comunhão pelo casal - Incidência de imposto de transmissão “inter vivos” sobre o valor que exceder a meação de cada cônjuge sobre a totalidade do patrimônio imobiliário do casal - Aferição do valor dos imóveis que, inexistindo avaliação judicial, deve ter por base o valor venal constante no lançamento do IPTU - Recurso não provido.
1. Trata-se de recurso interposto, tempestivamente, contra r. sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Patrocínio Paulista e negou o registro de carta de sentença extraída da ação de partilha de bens decorrente de separação judicial porque não foi comprovado o recolhimento do imposto de transmissão "inter vivos" em relação aos imóveis objeto das matrículas 4.237, 4.235 e 2.679, que foram atribuídos integralmente ao apelante.
Sustenta o apelante, em suma, que na forma do artigo 1º, inciso II, parágrafo 5º, da Lei Estadual nº 10.705/2000 compete ao Estado arrecadar o imposto devido sobre o excesso de meação ou quinhão atribuído a um dos cônjuges na divisão do patrimônio comum. Afirma que existe prevalência da legislação estadual sobre a municipal e que, em razão disso, a Lei nº 10.705/2000 revogou as disposições de tributação da mesma espécie e natureza contidas em leis municipais. Assevera que a incidência concomitante do ITCMD e do ITBI, tendo por origem o mesmo fato gerador, acarretaria dupla tributação. Assevera que não é devido imposto de transmissão porque na partilha realizada cada cônjuge recebeu bens com valor equivalente ao de sua respectiva meação. Requer a reforma da r. sentença para que a dúvida seja julgada improcedente.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
2. O apelante pretende o registro da carta de sentença extraída da partilha dos bens decorrente de sua separação consensual, pela qual lhe foi atribuída a totalidade dos imóveis objeto das matrículas 4.237 (fls. 43 e 71), 4.235 (fls.44 e 72), 2.679 (fls. 41 e 75) do Registro de Imóveis de Patrocínio Paulista.
O oficial registrador negou a prática do ato porque não foi comprovado o recolhimento do imposto de transmissão “inter vivos” que considerou devido sobre o quinhão que excede a meação do apelante em cada um dos imóveis partilhados.
A Constituição Federal atribui aos Municípios a competência para instituir imposto sobre a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis (art. 156, inciso II) e atribui aos Estados a competência para instituir imposto sobre transmissão "causa mortis" e doação de quaisquer bens ou direitos (artigo 155, inciso I).
São, como decorre do texto constitucional, impostos distintos, cada um de competência exclusiva de diferente entidade da federação, o que afasta as alegações de prevalência da lei estadual sobre a municipal e de dupla incidência de impostos de igual natureza.
O que importa verificar, pois, é se ocorreu transmissão de bem imóvel e, em caso positivo, se a transmissão se deu a título oneroso, com incidência do ITBI, ou a título gratuito, hipótese de que decorre a incidência do ITCMD.
3. A partilha de que se pretende o registro teve por objeto diferentes bens móveis e imóveis (fls. 66/80 e 98/99) que foram atribuídos com exclusividade a cada um dos cônjuges, com exceção do apartamento 04 do "Condomínio Itamarati" (fls. 77/78) que permaneceu na compropriedade de ambos.
Ao conjunto dos bens móveis e imóveis que coube a cada um dos cônjuges foi atribuído valor global idêntico (fls. 66/80 e 98/99), no que o apelante baseia a alegação de que a partilha não deu causa ao aumento de seu patrimônio.
Ocorre que a base de cálculo do imposto de transmissão é o valor venal dos imóveis (art. 33 do Código Tributário Nacional), o que faz a não incidência depender da equivalência de valores entre os imóveis atribuídos a cada cônjuge, sem qualquer consideração, para esta finalidade, dos valores atribuídos aos móveis. Assim decidiu este C. Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível nº 82.661-0/6, da Comarca de Catanduva, relator o Desembargador Luís de Macedo, em v. acórdão com o seguinte teor:
"E, no presente caso, a recusa de registro da carta de sentença é de ser mantida, não porque não houve comprovação do pagamento do imposto de transmissão de bens imóveis por ato “inter vivos”, mas sim porque o título judicial não fornece os elementos necessários à ilação de que tal imposto seria, na espécie, devido.
Yussef Said Cahali, a propósito, mencionando precedentes jurisprudenciais, ensina que: a) "quando os interessados (cônjuges) recebem partes iguais, constitui a partilha (na separação amigável) ato meramente declarativo da propriedade. Mas se um recebe acima do que lhe caberia em sua meação, sem dúvida, ocorre transmissão de propriedade imobiliária e devido é o respectivo tributo fiscal" ("Divórcio e Separação", 9ª ed., RT, 2000, pág. 164); b) "o fato gerador do imposto ora analisado é a diferença nos quinhões e meação sobre bens imóveis. Se a partilha dos bens imóveis fosse feita, igual por igual, inexistiria tributação. Esta incide apenas sobre as diferenças nos quinhões e meação. No caso somam-se os valores dos imóveis. Metade a metade em meação aos cônjuges. Se houver valor acima da respectiva meação o imposto incidirá sobre a diferença... A lei tributa a diferença recebida a mais em imóveis" (op. cit., pág. 167)".
Por seu turno, na partilha não foi observada integral correspondência entre os valores atribuídos aos imóveis e seus respectivos valores venais (fls. 66/90), pois o imóvel situado na Rua Camilo de Matos, 771, Ribeirão Preto, tinha em 2004 o valor venal de R$ 142.597,66 (fls. 108), mas os cônjuges lhe atribuíram o valor de R$ 80.000,00 (fls. 68/69).
Portanto, inexistente equivalência entre os valores dos imóveis atribuídos a cada um dos cônjuges, incide o imposto de transmissão “inter vivos” sobre o que exceder a meação neste patrimônio imobiliário.
Cabe, destarte, como única ressalva à r. sentença apelada, observar que havendo atribuição de bens imóveis a ambos os cônjuges o imposto de transmissão não incide sobre cada um dos imóveis isoladamente, como foi exigido pelo Sr. Oficial Registrador, mas somente sobre o excedente do que correspondia à meação no conjunto do patrimônio imobiliário, o que deve ser feito para que não haja incidência do tributo sem a respectiva transmissão de propriedade.
O imposto de transmissão aqui referido, por sua vez, é o “inter vivos”, que é devido ao Município porque a aquisição pelo cônjuge do que excedeu sua meação sobre o patrimônio imobiliário do casal se fez mediante reposição com bens móveis e, portanto, a título oneroso.
Ao registrador, por fim, compete exigir a prova do recolhimento do imposto de transmissão ou da sua isenção, impondo-se a recusa do registro quando, como ocorrido no presente caso, não foi produzida tal prova.
4. Ante o exposto, com a observação retro quanto à base de cálculo do imposto, nego provimento ao recurso.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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