Fechar Cartórios Extrajudiciais Registro de Chamado: 
https://www.suportesistemastjsp.com.br

Clique aqui para baixar o Manual de Registro de Chamado
Cidadão Serviço de Informações ao Cidadão (SIC) - Lei 12.527/11
 
 

 



Coordenadoria de Correições, Organização e Controle das Unidades Extrajudiciais

Despachos/Pareceres/Decisões 45861/2005


Acórdão _ DJ 458-6/1
: 26/03/2009

    A C Ó R D Ã O
 
    Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 458-6/1, da Comarca da CAPITAL, em que é apelante o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e apelada NEIDE APARECIDA MARTINS.
 
    ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
 
    Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
 
    São Paulo, 06 de dezembro de 2005.
 
    (a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
 
    V O T O
 
    Registro de Imóveis. Dúvida. Registro de carta de adjudicação expedida em autos de inventário. Necessidade de se arrolar a totalidade dos bens. Recurso provido para reformar a sentença que autorizou o registro da adjudicação da metade ideal.
 
    1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público (fls.157/173) contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Corregedor Permanente do Décimo Quarto Oficial do Registro de Imóveis da Comarca da Capital (fls.152/154), que julgou improcedente a dúvida suscitada, determinando o registro da carta de adjudicação expedida nos autos do arrolamento dos bens deixados por Antonio Nelson Martins.
 
    O título foi recusado ao registro, uma vez que foi arrolada apenas a parte ideal do imóvel matriculado naquela Serventia sob o nº 145.615.
 
    Sustenta, em síntese, o recorrente, em preliminar, que a decisão é nula, uma vez que não foi colhida a manifestação do Ministério Público. Quanto ao mérito, afirmou que a meação do cônjuge supérstite recai sobre a universalidade dos bens do casal, sendo necessária a declaração de todos os bens nos autos do inventário.
 
    A Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo acolhimento da matéria preliminar e pelo provimento do recurso (fls. 184/190).
 
    É o relatório.
 
    2. A preliminar de nulidade da decisão deve ser repelida.
 
    Já ficou assentado na Corregedoria Geral de Justiça o entendimento de que o Ministério Público tem legitimidade para se manifestar em procedimentos de natureza administrativa:
 
    “Entre outras atribuições, incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127, ‘caput’, da Constituição Federal). Antônio Cláudio da Costa Machado ensina que ao atribuir ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica está a Constituição Federal: “...querendo dizer que cumpre ao ‘parquet’ a defesa da ordem pública amplamente considerada (a defesa da Constituição Federal e das leis substanciais e instrumentais) nos processos em que os litígios envolvam leis de ordem pública, quer dizer, as que criam direitos indisponíveis. O que torna possível e legítima a atuação tutelatória do Ministério Público é, portanto, a indisponibilidade de direitos que resulta da existência de leis de ordem pública...”. (A Intervenção do Ministério Público no Processo Civil Brasileiro, Ed. Saraiva, 1989, pág. 46). Decorre dessa lição, que na defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis está o fundamento para a intervenção do Ministério Público nos procedimentos administrativos que versam sobre os registros públicos que, por sua vez, são regidos por normas cogentes cuja aplicação não pode ser afastada mediante convenção dos interessados. A intervenção do Ministério Público não é, de fato, facultativa ou optativa do Ministério Público, como sustentou o Juízo recorrido em sua decisão. Ademais, a jurisprudência se tem posicionado no sentido de que compete ao Judiciário aferir a existência do interesse público que imponha a intervenção do Ministério Público, como foi decidido pela Colenda Terceira Turma do E. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 6.872-0-GO, relator o Ministro Eduardo Ribeiro (RSTJ 57/195-197). O parâmetro que deve ser adotado para identificar o interesse social que legitima a intervenção do Ministério Público também é dado por Antônio Cláudio da Costa Machado, para quem não basta que de determinado processo decorra alteração do registro, mas é necessário que o juiz seja chamado para: “...definir interesses concernentes ao direito registrário...”(obra citada, pág. 416). E quando o procedimento versa sobre matéria de registro, como ensina Antônio Cláudio da Costa Machado, se discute sobre direitos indisponíveis: “...no sentido de que são de realização obrigatória, no sentido de que as faculdades conferidas não são passíveis de renúncia, transação, disposição, enfim, há vista que deles dependem sobremaneira a estabilidade e a segurança de grande parte das relações jurídicas.” (obra citada, pág. 415).O artigo 82, inciso III, do Código de Processo Civil, que por meio de interpretação extensiva é aplicável neste procedimento, também obriga a intervenção do Ministério Público quando presente o interesse social” (Processo CG nº 916/2004).
 
    Tal entendimento se aplica também ao caso em questão, não olvidando que o artigo 200 da Lei de Registros Públicos estabelece a intervenção do Ministério Público nos procedimentos de dúvida, a qual deve ocorrer ainda que ausente impugnação por parte do interessado, diante do que dispõe o artigo 82 do Código de Processo Civil.
 
    Comentando a Lei de Registros Públicos, no que toca a intervenção do Ministério Público, explica Walter Ceneviva que “impugnada a dúvida, deve ser ouvido o Ministério Público. Pareceria, dada a menção expressa constante do artigo seguinte, que só em caso de impugnação o Ministério Público interviria. Entretanto, o Código de Processo Civil supre a deficiência, impondo-lhe a intervenção ‘como fiscal da lei’. E continua: “no procedimento de dúvida, o órgão do Ministério Público intervém como fiscal da lei. Tem vista dos autos depois das partes, é intimado em todos os atos, pode juntar documentos e certidões, requerer medidas e diligências necessárias ao descobrimento da verdade, manifestar-se a favor da procedência ou improcedência da dúvida. Pode apelar da sentença contrária à sua manifestação. A presença do Ministério Público na dúvida se insere no quadro da dúplice função atribuída a esse órgão: a de agente e a de interveniente. Quando atuar como órgão interveniente, poderá defender interesses públicos ou privados, erigidos pela lei em interesses a serem zelados, ou somente fiscalizar a aplicação da lei, ou, ainda, ser órgão eminentemente consultivo. Nessa função o representante do Ministério Público pode, por exemplo, verificar se foram cumpridos os requisitos da Lei 7.433, de 18 de dezembro de 1985” (Lei de Registros Públicos Comentada, 15ª edição, 2002, páginas 409 e 411).
 
    A intervenção do Ministério Público se faz nos processos de dúvida havendo ou não impugnação por parte do interessado, sem distinção.
 
    Mas embora seja indiscutível a legitimidade do Ministério Público para intervir no feito, não é o caso de se decretar a nulidade.
 
    Com efeito, embora o representante do Ministério Público não tenha sido intimado para manifestação, é certo que tomou conhecimento do processo, tendo ofertado recurso com razões de mérito, acarretando também a participação da Procuradoria Geral de Justiça.
 
    Além disso, não se vislumbra prejuízo ao interesse público capaz de ensejar a nulidade argüida, mesmo porque em se tratando de processo de dúvida, toda matéria é devolvida em grau de recurso.
 
    Pertinente a citação do seguinte entendimento jurisprudencial:
 
    “A intervenção da Procuradoria da Justiça em segundo grau evita a anulação de processo no qual o MP não tenha sido intimado em primeiro grau, desde que não demonstrado o prejuízo ao interesse do tutelado” (VI ENTA-concl. 42, aprovada por maioria; já retificada). No mesmo sentido RSTJ 148/185.
 
    Quanto ao mérito, o recurso comporta provimento.
 
    Saliente-se, de início, ser atribuição e dever do Oficial Registrador proceder à qualificação registrária da carta de adjudicação extraída dos autos do inventário. Até mesmo os títulos judiciais submetem-se à qualificação registrária, com fulcro na aplicação dos princípios e normas formais da legislação específica vigente à época do momento do respectivo ingresso, principalmente para a verificação de sua conformidade com os postulados e princípios registrários (Apelações Cíveis nºs. 22.417-0/4, Piracaia e 44.307-0/3, Campinas). “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais” (item 106, do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça).
 
    Com o falecimento de Antonio Nelson Martins, a cônjuge sobrevivente requereu a abertura do inventário dos bens deixados pelo “de cujus”, relacionando no processo sucessório apenas a metade ideal do bem inscrito no Décimo Quarto Oficial de Registro de Imóveis da Capital sob o nº 145.615.
 
    Exibida a carta de adjudicação que do inventário se extraiu, recusou-se o Oficial a registrá-la, com o fundamento de que ao inventário devem concorrer todos os bens da herança, tese que não foi acolhida pela sentença ora atacada.
 
    A decisão merece ser reformada, uma vez que contrariou a doutrina e a jurisprudência relativa ao tema.
 
    Com efeito, se é certo que o direito do cônjuge supérstite à meação deriva do regime matrimonial de bens e não “sucessionis causa” (cfr. Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, v. VI, n. 446), não menos correto é que dessa premissa não se infere a divisão dos bens em frações ideais. Por isso que se forma uma comunidade hereditária (cfr. Theodor Kipp, Derecho de Sucesiones, t. V, v. II, § 114), que se ultima com o desfecho do processo sucessório.
 
    A comunhão decorrente do casamento é “pro indiviso”. Ou seja, a parcela ideal pertencente a cada cônjuge não pode ser destacada, o que somente ocorre quando dissolvida a sociedade conjugal.
 
    Em sendo a morte a causa da extinção do casamento e da comunhão, a metade só se extremará com a partilha, posto que indivisível antes dela.
 
    Ensina Afrânio de Carvalho que “não importa que, em se tratando de cônjuge sobrevivente casado no regime da comunhão de bens, metade do imóvel já lhe pertença desde o casamento, porque o título reúne essa parte ideal, societária, com a outra, sucessória, para recompor a unidade real do “de cujus”. A partilha abrange todo o patrimônio do morto e todos os interessados, desdobrando-se em duas partes, a societária e a sucessória, embora o seu sentido se restrinja por vezes à segunda. Por isso, dá em pagamento ao cônjuge sobrevivente ambas as metades que lhe caibam, observando dessa maneira o sentido global da operação, expressa na ordem de pagamento preceituado para o seu esboço, a qual enumera, em segundo lugar, depois das dívidas, a meação do cônjuge e, em seguida, a meação do falecido que, na hipótese, passa também ao cônjuge” (Registro de Imóveis, Forense, 3ª Ed., RJ 1982, pág. 281).
 
    A propósito do tema, o Colendo Conselho Superior da Magistratura do Estado, apreciando caso em que o Sexto Cartório de Registro de Imóveis da Capital recusara registro de carta de adjudicação exibida por viúva meeira, decidiu na mesma direção:
 
    "Com o falecimento do marido, procedeu ela (cônjuge sobrevivente) ao inventário. Fê-lo, todavia, indicando somente a metade ideal do imóvel. Ora, nos termos do art. 923, IV, do Código de Processo Civil, o inventário deve conter a 'relação completa e individuada de todos os bens do espólio e dos alheios que nele forem encontrados. O imóvel, no seu todo, era bem comum ao falecido e à apelante. Devia, pois, figurar do inventário" (ap. cível 146-0, Capital, 29.12.80, Rel. Des. Adriano Marrey; ‘apud’ Narciso Orlandi Neto, Registro de Imóveis, ed. 1982, pp. 30-32).
 
    “O espólio é uma universalidade de bens que reúne todos aqueles que integravam o patrimônio do casal, em comum até a data do óbito de um dos cônjuges. Com a morte, esse patrimônio assume inteiramente o estado de indivisão já referido, sendo indispensável a partilha do todo, para resolver essa situação”. (Apelação Cível nº 62.986-0/2, Araraquara).
 
    No mesmo sentido decidiu-se nas apelações cíveis 5.054-0, Capital, 27.1.86, e 5.444-0, 5.446-0, 5.818-0 todas de Taquaritinga, e 017289-0/7 de Campinas.
 
    Para permitir o ingresso do título no folio real, a carta de adjudicação deverá fazer menção à totalidade do bem.
 
    Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a sentença recorrida.
 
    (a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça
 
 


Anexos


Descrição* Arquivo  
 Quantidade de registros: 0