Despachos/Pareceres/Decisões
28467/2005
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ACÓRDÃO _ DJ 284-6/7
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 284-6/7, da Comarca da CAPITAL, em que é apelante o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e apelados SZYJA DAWID KORN e ELIAS KORN NETO.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em não conhecer do recurso, determinando a remessa dos autos à E. Corregedoria Geral da Justiça, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 13 de janeiro de 2005.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
Registro de imóveis - Dúvida - Escritura pública de doação de imóvel e de cancelamento de cláusula de inalienabilidade imposta em doação anterior - Necessidade de prévio cancelamento da cláusula de inalienabilidade, para que seja possível o registro da escritura relativa à nova doação - Competência da Corregedoria Geral da Justiça para apreciar o recurso interposto contra a determinação de cancelamento da cláusula de inalienabilidade - Recurso não conhecido, com determinação de remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça.
1. Trata-se de apelação interposta, tempestivamente, contra r. sentença que julgou improcedente a dúvida inversamente suscitada e determinou a averbação do cancelamento de cláusula de inalienabilidade que foi instituída, em relação ao imóvel objeto na matrícula 9.514 do 8º Registro de Imóveis de São Paulo, mediante doação efetuada pelo atual usufrutuário e sua falecida mulher, para vigorar enquanto fossem vivos, e que determinou o subseqüente registro, na mesma matrícula, de escritura de doação de quinhões ideais outorgada pelos nu proprietários do imóvel.
Sustenta o apelante, em suma, que Szyja Dawid Korn e Etla Korn doaram aos seus filhos Miriam Korn, Jair Korn e Elias Korn Neto o imóvel objeto da matrícula 9.514 do 8º Registro de Imóveis de São Paulo, o que fizeram reservando para si o usufruto e gravando o imóvel com cláusula de inalienabilidade a ser extinta com suas mortes. Com o falecimento de Etla Korn, resolveram os filhos Miriam e Jair doar seus quinhões no imóvel para o co-proprietário Elias Korn Neto, com o levantamento, por Szyja Dawid Korn, da cláusula de inalienabilidade. Diz que a cláusula de inalienabilidade pode ser imposta pelo testador, ou pelo doador sobre os bens transmitidos por ato de liberalidade. Afirma que o vínculo de inalienabilidade está condicionado à vontade do instituidor e não pode ser dispensado ou invalidado por ato judicial. Alega que a cláusula de inalienabilidade foi instituída, neste caso, para vigorar até a morte dos doadores, e com a morte de Etla Korn não pode o encargo ser revogado somente pelo doador sobrevivente. Assim, ao instituidor sobrevivente resta a possibilidade de revogar o encargo imposto sobre a metade ideal do imóvel que lhe pertencia, devendo ser mantida a inalienabilidade sobre o quinhão doado por Etla Korn. Requer a reforma da r. sentença, com a manutenção das restrições impostas pelo oficial registrador ao cancelamento da cláusula de inalienabilidade e ao registro da escritura de doação.
Os apelados, em contra-razões, alegam que a cláusula de inalienabilidade foi instituída por Szyja Dawid Korn e Etla Korn, para vigorar enquanto fossem vivos. Afirmam que a morte de Etla Korn é causa de extinção do encargo imposto sobre o quinhão do imóvel que a esta pertencia, restando somente a restrição sobre a parcela do imóvel onerada por Szyja Dawid Korn. Aduzem que ao doador sobrevivente é possível revogar a cláusula de inalienabilidade que atualmente é restrita ao quinhão do imóvel que doou. Asseveram que a recusa da averbação da extinção do vínculo, e do registro da escritura de doação, constitui violação do exercício do direito de propriedade.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso afirmando que a cláusula de inalienabilidade foi imposta para vigorar durante a vida de Szyja Dawid Korn e Etla Korn, e que em razão da morte de Etla permanece somente o encargo relativo ao quinhão do instituidor sobrevivente que, por sua vez, pode revogá-lo.
É o relatório.
2. A presente dúvida inversa tem como objeto afastar a recusa do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo em promover a averbação do cancelamento da cláusula de inalienabilidade que grava o imóvel objeto da matrícula 9.514 do 8º Registro de Imóveis de São Paulo, e o subseqüente registro de doação de frações ideais da nua propriedade do mesmo imóvel.
Conforme a certidão de fls. 09/10, Szyja Dawid Korn e sua mulher, Etla Korn, doaram para seus filhos Elias Korn Neto, Miriam Korn e Jair Korn o imóvel objeto da matrícula 9.514 do 8º Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo, reservando em seu favor o usufruto vitalício, com direito de acrescer em benefício do doador sobrevivente, e instituindo sobre o imóvel as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, o que fizeram estabelecendo que: "...a cláusula de inalienabilidade se extinguirá com a morte dos doadores", como constou na averbação 7 da referida matrícula.
Morta a usufrutuária Etla Korn (fls. 18), os co-proprietários Miriam Korn e Jair Korn efetuaram, por meio da escritura pública, a doação de seus quinhões na nua propriedade do referido imóvel para seu irmão, Elias Korn, e pela mesma escritura o usufrutuário Szyja Dawid Korn extinguiu a cláusula de inalienabilidade que grava o imóvel, mantendo, entretanto, as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade.
A escritura de cancelamento da cláusula de inalienabilidade e de doação de frações ideais da nua propriedade teve o registro negado pelo oficial registrador que entendeu não ser possível o cancelamento da inalienabilidade instituída sobre o quinhão do imóvel doado por Etla Korn aos seus filhos, uma vez que na doação ficou estabelecido que a oneração se extinguiria com a morte de ambos os doadores.
O registro da escritura de doação, como decorre da nota de devolução de fls. 17 e da manifestação apresentada pelo 8º Oficial de Registro de Imóveis, tem como obstáculos a cláusula de inalienabilidade que grava o imóvel e a não apresentação da certidão de óbito de Etla Korn.
A dissensão entre o oficial registrador e os apresentantes do título, desta forma, somente diz respeito à pretensão de cancelamento da cláusula de inalienabilidade, o que constitui condição para o registro da escritura de doação de frações ideais da nua propriedade do imóvel gravado.
O mesmo se dá com a insurgência manifestada pelo apelante com a r. sentença apelada, pois fundada apenas na impossibilidade de registro da nova doação em razão da cláusula de inalienabilidade que grava o imóvel.
Ocorre que o cancelamento da cláusula de inalienabilidade se faz mediante ato de averbação cuja recusa não é atacável por meio de dúvida registrária, mas de procedimento administrativo distinto cuja solução, em grau de recurso, é da alçada da E. Corregedoria Geral da Justiça.
Assim sucede porque a competência deste E. Conselho Superior da Magistratura é restrita aos procedimentos que envolvam dissensão sobre a prática de ato de registro em sentido estrito, como decidido no v. acórdão prolatado na Apelação Cível nº 035154-0/3, da Comarca de Taubaté, em que foi relator o Desembargador Márcio Martins Bonilha, com o seguinte teor:
"Como tem decidido de forma absolutamente tranqüila e reiterada este Conselho Superior da Magistratura, o procedimento judicial de natureza administrativa da dúvida está reservado à solução de dissenso entre o registrador e o interessado, tendo por objeto ingresso de título que diga respeito a registro em sentido estrito (Apelações Cíveis 21.085/0-0, 19.900-0/1, 21.160-0/3, 21.203-0/0, 20.361-0/3, 18.534-0/3, 17.676-0/3, 23.344-0/8 e 23.690-0/6, entre outras).
Em termos diversos somente se admite o procedimento da dúvida naquelas hipóteses em que o título em exame é, em tese, potencialmente hábil a gerar mutação jurídico-real com força de inscrição.
No caso concreto, almeja a recorrente apenas e tão somente ato averbatório de retificação de registro, para inserção da área de superfície do prédio. Discute-se, em outras palavras, se o preenchimento das emissões existentes na matrícula deve ser feito por retificação unilateral ou bilateral do cadastro predial.
Não deseja e não cogita o recorrente, em suma, de registro "strictu sensu", razão pela qual está a divergência resumida a saber da viabilidade da almejada averbação retificatória.
A competência recursal para exame do tema em foco, tal como posto e desejado pelo recorrente - averbação retificatória - é da Corregedoria Geral da Justiça." (Revista de Direito Administrativo, nº 41/210).
Diante disso, envolvendo a dissensão apenas a prática de ato de averbação, impõe-se o não conhecimento da apelação, com remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça.
Ante o exposto, não conheço do recurso e determino a remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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