Despachos/Pareceres/Decisões
25963/2005
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ACÓRDÃO _ DJ 259-6/3
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 259-6/3, da Comarca de URUPÊS, em que é apelante FATATI EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S/C LTDA (repdo.p/s/sócio FÁBIO BIROLLI DE MORAES) e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 12 de maio de 2005.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
Ementa: Registro de imóveis - Apelação - Dúvida julgada procedente - Ações cíveis contra o loteador que não impedem o registro de loteamento - Necessidade, porém, de complementação dos documentos apresentados para registro, a fim de demonstrar que o imóvel a ser loteado tem as medidas perimetrais indicadas na planta do loteamento - Necessidade, ademais, de esclarecimentos sobre a existência de servidão de passagem indicada na planta do loteamento, mas omitida no memorial descritivo e na matrícula do imóvel - Ação penal contra o loteador, por fim, com conteúdo que demanda melhores esclarecimentos - Recurso a que se nega provimento.
1. Trata-se de apelação interposta por FATATI - Empreendimentos Imobiliários S/C Ltda. contra r. sentença que julgou procedente dúvida inversamente suscitada e manteve a recusa do Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Urupês em promover o registro, na matrícula 11.726, do loteamento denominado "Marinas do Tietê", o que foi feito porque no prazo de validade da prenotação não foi apresentada a certidão vintenária do imóvel e porque não foram atendidas todas as exigências efetuadas pelo novo oficial registrador, relacionadas na nota de fls. 315/316.
Sustenta o apelante, em suma, que o requerimento de registro do loteamento foi prenotado em 26 de setembro de 2003 e que após, em 1º de outubro de 2003, o então oficial designado para responder pelo Registro de Imóveis formulou exigências a serem atendidas até 27 de outubro do mesmo ano, as quais foram cumpridas em 24 de outubro, ou seja, dentro do prazo fixado. Aduz que foi designado novo oficial para responder pelo Registro de Imóveis da Comarca de Urupês, o qual cancelou a prenotação porque disse faltar a certidão vintenária do imóvel. Afirma que no prazo de validade da prenotação cumpriu todas as exigências contidas na nota de devolução datada de 1º de outubro de 2003, apresentando histórico dos títulos de propriedade nos últimos vinte anos, acompanhado das respectivas certidões comprobatórias do domínio. Alega que o cancelamento da prenotação não pode subsistir em razão do atendimento das exigências formuladas quando do requerimento de registro do loteamento. Requer o restabelecimento da prenotação e o registro do loteamento.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fls. 430/433).
O julgamento foi convertido em diligência para a juntada de certidões e para esclarecimentos, pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Urupês, sobre a perfeita correspondência entre os limites da cota 386 indicados na planta do loteamento juntada às fls. 83, que foi aprovada pela Prefeitura Municipal de Sales, e os limites da mesma cota 386 definidos para imóvel de propriedade da CESP que com confronta aquele a ser loteado, sobrevindo a manifestação de fls. 441/442.
É o relatório.
2. A questão relativa ao cancelamento da prenotação efetuada em 26 de setembro de 2003 não tem relevância em razão do resultado do presente recurso.
De qualquer forma, anoto que em razão da suscitação da dúvida inversa deveria ser promovida nova prenotação do título neste procedimento exibido para registro, pois, como visto, foi cancelada a anteriormente efetuada.
3. Os documentos apresentados para o registro do loteamento foram prenotados em 26 de setembro de 2003 e o registro foi recusado mediante apresentação da nota de devolução de fls. 23/25, elaborada por Orlando Aparecido Fuzaro que na época estava designado para responder pela delegação do Registro de Imóveis de Urupês.
Quando da reapresentação do título estava designado para responder pela delegação o Sr. Belmiro Fazoli que promoveu nova qualificação e formulou as exigências relacionadas na nota de fls. 314/315.
Essas novas exigências, efetuadas em novembro de 2003, foram parcialmente atendidas pelo apelante (fls. 318/319) que, porém, deixou de apresentar a Certidão Negativa de Dívida Ativa da União em nome de Richelieu Castilho Sabino.
Tal certidão, entretanto, não era necessária uma vez que apresentada prova da regularidade fiscal relativa à incidência de ITR (fls. 372) e de IPTU sobre o imóvel (fls. 87 e 113) que foi declarado urbano pela Prefeitura Municipal de Urupês (fls. 371).
4. O mesmo se dá com a não apresentação de certidão vintenária do imóvel, pois a certidão faltante é do próprio Oficial de Registro de Imóveis a quem solicitado o registro do loteamento e que, atendendo ao determinado na decisão de fls. 434, acabou por juntá-la aos autos.
5. Cabe, por sua vez, verificar se o risco decorrente das ações pessoais, neste caso movidas contra a loteadora, o seu sócio e os ex-proprietários do imóvel, é suficiente para impedir o registro do loteamento.
A certidão de fls. 114/119 indica a existência de várias ações com valores que, porém, não são elevados e, por este motivo, não comprometem o empreendimento.
A única exceção, quanto ao valor, é relativa ao Processo 2.309/02 da 2ª Vara de Catanduva (fls. 115) que, porém, foi extinto mediante transação celebrada entre as partes (fls. 132).
Também de valores insuficientes para acarretar risco ao empreendimento são os protestos relacionados nas certidões de fls. 154/155, 192/193 e 195.
Igualmente no que se refere aos valores, são as ações indicadas na certidão de fls. 198 e os protestos relacionados às fls. 208, promovidos contra Fábio Birolli de Moraes.
O mesmo ocorre com as ações movidas contra Maria José de Moraes Todaro (fls. 219), Richelieu Castilho Sabino e Maria Helena Avelar Sabino (fls. 241/245), sendo que a ação a que se refere a certidão de fls. 245 é de desapropriação e dela decorre a existência de crédito em favor de Richelieu e sua mulher.
Para evitar o registro do loteamento não basta a existência de ações pessoais movidas contra o loteador ou os ex-proprietários do imóvel. É necessário que, além das ações pessoais, não tenha o loteador idoneidade financeira que permita afastar eventual constrição judicial do imóvel ou dos lotes a serem formados, ou de ressarcir os danos que dessa constrição decorram aos que comprarem os futuros lotes, situação que não está presente neste procedimento de dúvida.
6. Apesar disso, no procedimento administrativo da dúvida registrária a qualificação do título é devolvida, por inteiro, ao Juiz Corregedor Permanente e o mesmo ocorre quando do julgamento da apelação.
Pode o Juiz, por este motivo, afastar oposição apresentada pelo Oficial de Registro de Imóveis ou reconhecer a existência de impedimento por este não apontado, assim como pode o Tribunal fazê-lo, no julgamento da apelação, tanto em relação aos fundamentos deduzidos pelo Oficial como em relação aos adotados na sentença.
Sobre esta matéria, em igual sentido foi o v. acórdão prolatado na Apelação Cível nº 24.587-0/3, da Comarca de Itu, em que foi relator o Desembargador Antônio Carlos Alves Braga, em que se verifica:
"Ponto primeiro a ser ressaltado diz com a natureza da dúvida, em cujo bojo se procede, verdadeiramente, a uma nova qualificação, não havendo vinculação aos óbices levantados pelo Oficial (cf. Ap. Cív. nº 7.293-0/7).
E isto também para o segundo grau de cognição, em que se renova por completo aquela qualificação do título, independentemente do julgamento de primeiro grau.
Tal ressalva se faz, de um lado, para asseverar não macular a sentença o fato de ela ter acolhido óbice que o Oficial já havia tido por superado."
7. No presente caso, remanescem outros obstáculos que impedem o registro.
O primeiro decorre da insuficiência de elementos para aquilatar se a cota da CESP nº 386 referida na matrícula do imóvel (fls. 443/452) tem a conformação indicada na planta do loteamento que foi apresentada para registro (fls. 83).
O Sr. Oficial de Registro de Imóveis informou que não tem elementos para aquilatar a existência de correspondência entre os limites da cota 386 indicados na planta do loteamento e os definidos para o imóvel de propriedade da CESP, pois não mantém transcrição ou matrícula para este último (fls. 441).
As Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça estabelecem, no item 162 do Capítulo XX, que:
"Será sempre indispensável a correspondência da descrição e da área do imóvel a ser loteado com as que constarem da transcrição ou da matrícula respectiva, exigindo-se, caso contrário, prévia retificação".
Esta correspondência há de ser entendida como perfeita identidade entre a área do imóvel contida no registro do loteamento e a área descrita na matrícula como de propriedade do loteador, para preservação da especialidade e para que não se inclua no loteamento imóvel ou parcela de imóvel do domínio de terceiro.
Não havendo como aquilatar a exata localização de todos os limites e confrontações do imóvel, impõe-se a recusa do registro do loteamento para que o título seja complementado com novos elementos extraídos da matrícula do imóvel de propriedade da CESP, inclusive plantas arquivadas pelo Oficial Registrador que mantiver esta última, ou para a retificação da matrícula do imóvel a ser loteado caso ao final se mostre necessária.
8. Ainda, na planta do loteamento (fls. 83) consta a existência de servidão de passagem no imóvel que confronta com aquele a ser loteado, iniciando nos limites deste último e atravessando o imóvel de propriedade da CESP até chegar ao leito do Rio Tietê, mas a descrição dessa servidão contida na planta do loteamento não confere com a da única servidão averbada, sob nº 3, na matrícula 11.726 (fls. 443-verso), e não confere com a servidão registrada, sob nº 16, na matrícula 3.983 que deu origem à matrícula 11.726(fls. 448).
Essa divergência também impede o registro do loteamento, por inobservância da especialidade do registro imobiliário.
9. O contrato padrão de compromisso de compra e venda, outrossim, prevê a incidência de juros moratórios de 0,33% ao dia sobre as prestações não pagas com pontualidade (fls. 237), o que excede a taxa permitida no artigo 406 do Código Civil e no Decreto nº 22.626/33.
Prevê o contrato padrão, ademais, a cobrança de taxa para a cessão do contrato de compromisso de compra e venda pelo compromissário comprador (fls. 239, cláusula 14), o que restringe o exercício do direito previsto no artigo 31, parágrafo 1º, da Lei nº 6.766/79.
Estabelece, ainda, com a rubrica de "taxa de administração", cláusula penal de 20% sobre o ressarcimento de despesas feitas pelo loteador para conservação dos lotes que forem vendidos e das acessões nestes introduzidas (fls. 238, cláusula 10), o que não se coaduna com a natureza do ressarcimento de tais despesas.
10. Por fim, os inquéritos policiais referidos na certidão de fls. 199 não impedem o registro do loteamento, pois neles não foi oferecida, ainda, denúncia, ao passo que a ação penal referida na certidão de fls. 200, movida contra Fábio Birolli de Moraes e Maria José de Moraes Todaro, também não impede tal registro porque promovida a suspensão condicional do processo.
Resta, porém, a ação penal indicada na certidão de fls. 204, movida contra Fábio Birolli de Morais (processo 263/01 da Comarca de Urupês), que demanda melhor esclarecimento sobre seu conteúdo, mediante apresentação de certidão mais completa ou cópias do processo, para permitir a verificação de possível prejuízo que dela possa advir ao empreendimento e, desta forma, aos futuros adquirentes dos lotes.
11. Ante o exposto, embora por fundamentos diversos dos adotados na r. sentença, nego provimento ao recurso e mantenho a procedência da dúvida.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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