Despachos/Pareceres/Decisões
31161/2005
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ACÓRDÃO _ DJ 311-6/1
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 311-6/1, da Comarca de SERRA NEGRA, em que é apelante CIRLEIDE GOMES DE JESUS e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 14 de abril de 2005.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
Registro de imóveis - Dúvida julgada procedente - Registro de contrato particular de compromisso de compra e venda com valor superior a trinta salários mínimos - Escritura pública que não se mostra essencial para a validade do negócio jurídico - Inteligência dos artigos 108 e 1.417, ambos do Código Civil -Recurso provido para autorizar o registro do título.
1. Trata-se de apelação interposta por Cirleide Gomes de Jesus contra r. sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registros de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Serra Negra e negou o registro de contrato particular de compromisso de compra e venda dos lotes 04 e 05 da Quadra "G" do loteamento Nova Lindóia Residence, situado em Águas de Lindóia, Comarca de Serra Negra, objetos, respectivamente, das matrículas 28.872 e 28.873, porque estando no contrato atribuído a cada um dos imóveis valor superior a trinta salários mínimos é a escritura pública essencial para a validade do negócio jurídico.
Sustenta a apelante, em suma, que a escritura pública não é necessária para a validade do negócio jurídico, conforme precedentes jurisprudenciais, e que o valor real de cada imóvel é inferior a trinta salários mínimos, como decorre do lançamento de IPTU efetuado pela Prefeitura Municipal e conforme avaliações que obteve em imobiliárias situadas no Município de Águas de Lindóia. Esclarece que a indicação para os imóveis de valor superior ao preço de mercado decorreu de imposição do promitente vendedor e não pode prejudicá-la. Requer a improcedência da dúvida.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pela manutenção da r. sentença apelada.
É o relatório.
2. A matéria aqui tratada é idêntica à apreciada por este C. Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível nº 000.298.6/0-00, da Comarca de Serra Negra, em que reconhecida a validade do contrato particular de compromisso de compra e venda de imóvel independente do valor atribuído ao negócio jurídico, e impõe-se igual solução também para o presente recurso.
Isto porque, conforme decidido na referida Apelação Cível nº 000.298.6/0-00:
"Não se sustenta a pretendida imprescindibilidade de escritura pública, apesar do valor da operação, em se tratando de compromisso de compra e venda.
Deveras, o artigo 108 do novo Código Civil, ao enunciar a exigência invocada, ressalva: "não dispondo a lei em contrário".
Ora, na hipótese da promessa ora em foco, a disposição em contrário acha-se insculpida no mesmo estatuto substantivo, cujo artigo 1.417 é expresso e trata, justamente, do ingresso do contrato no fólio: "Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel" (grifei).
Por isso mesmo, Theotônio Negrão, em glosa àquele artigo 108, assinala que "podem, porém, ser celebrados por instrumento particular, qualquer que seja o seu valor, entre outros: ...os compromissos de compra e venda" (Código Civil e Legislação em Vigor, 23ª ed., Saraiva, S. Paulo, 2004, p. 64).
Disso não discrepa Pablo Stolze Gagliano: "A forma deste contrato, como se pode perceber da simples leitura do art. 1.417, poderá ser pública ou particular, cabendo-nos advertir que este artigo é de aplicação específica em face do art. 108 que exige a escritura pública nos atos de alienação ou constituição de direitos reais imobiliários que superem o teto de 30 (trinta) salários mínimos. E é melhor que assim o seja. Uma das vantagens da promessa de compra e venda é, exatamente, a possibilidade de sua formalização sem os rigores do instrumento público, o que, de certa forma, evita a ocorrência de nulidade decorrente de vício de forma" (Código Civil Comentado, vol. XIII, Atlas, S. Paulo, 2004, p. 232). Arremata: "Portanto, podemos concluir que a inexigibilidade da forma pública facilita a celebração da promessa de compra e venda, tornando-a mais acessível às classes menos abastadas, além de evitar nulidade pelo vício de forma" (ob. cit., p. 233).
Em suma, cuidou o legislador de disciplinar o compromisso por meio de regra especial, que o afasta do lugar comum e autoriza, independentemente da expressão econômica, sua concretização por instrumento particular, tal como o de que aqui se cogita.
Sob esse aspecto, pois, não se sustenta a recusa do registrador".
Ante o exposto, dou provimento ao recurso e julgo a dúvida improcedente.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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