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Coordenadoria de Correições, Organização e Controle das Unidades Extrajudiciais

Despachos/Pareceres/Decisões 25660/2005


ACÓRDÃO _ DJ 256-6/0
: 26/03/2009

   A C Ó R D Ã O
 
   Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 256-6/0, da Comarca da CAPITAL, em que é apelante o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e apelado o CONDOMÍNIO EDIFÍCIO ULTRAMAR.
 
   ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
 
   Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
 
   São Paulo, 10 de fevereiro de 2005.
 
   (a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
 
   V O T O
 
   REGISTRO DE IMÓVEIS - Carta de arrematação - Condomínio exeqüente como arrematante - Inteligência do artigo 63, § 3º, da Lei nº 4.591/64 - Viabilidade da aquisição apesar da ausência de personalidade jurídica - Anuência necessária dos condôminos em assembléia geral, porém, não demonstrada - Impossibilidade do registro - Recurso provido.
 
   1. Cuida-se de apelação interposta pelo Ministério Público contra sentença, proferida em feito processado como dúvida inversa, que julgou improcedente a recusa do 2º Oficial de Registros de Imóveis da Capital e determinou o registro de carta de arrematação (fls. 53) passada a favor do Condomínio Edifício Ultramar, oriunda de ação de execução por este promovida, por débito condominial, contra Ultramar Imóveis Ltda., referente ao apartamento nº 13 daquele edifício, matriculado sob nº 68.794.
 
   Afirma o apelante "que o condomínio não pode figurar como adquirente de propriedade imobiliária, já que não tem personalidade jurídica", surgindo como única exceção a "hipótese prevista no artigo 63, parágrafo 3º, da Lei Federal 4.591/64", que não corresponde ao caso dos autos (fls. 102).
 
   Em contra-razões, o recorrido sustenta o acerto da decisão (fls. 109/125).
 
   Dessume-se que o "Parquet" de segundo grau, embora tenha concluído sua manifestação opinando pelo "desprovimento do recurso" (fls. 136), na verdade almeja, dado o teor da fundamentação exposta, "a reforma da respeitável sentença" (fls. 134).
 
   É o relatório.
 
   2. Não se pode cogitar, em face do ordenamento vigente, de reconhecer ao condomínio edilício personalidade jurídica.
 
   Nesse rumo, Caio Mário da Silva Pereira pondera que "a Lei nº 4.591, de 1964, trata cada uma das unidades como propriedade exclusiva, e, portanto, como objeto de relação jurídica específica". Reputa, assim, "inadequada a invocação do conceito de personificação" (Condomínio e Incorporações, 10ª ed., Forense, Rio de Janeiro, 1998, pág. 89).
 
   Oportuno trazer à colação o escólio de João Batista Lopes (Condomínio, 5ª ed., R.T., São Paulo, págs. 58/59):
 
   "A pretendida personalização do patrimônio comum é, porém, insustentável, porque não existe uma pessoa jurídica titular das unidades autônomas e das partes comuns do edifício.
 
   "É certo que, em contrário, existem respeitáveis opiniões doutrinárias e alguns precedentes judiciários.
 
   "O argumento mais forte em que se apóia essa corrente é o dispositivo do art. 63, § 3º, da Lei 4591/64, in verbis: 'no prazo de 24 horas após a realização do leilão final, o condomínio, por decisão unânime da assembléia geral em condições de igualdade com terceiros, terá preferência na aquisição dos bens, caso em que serão adjudicados ao condomínio'.
 
   "Como se vê, o texto legal alude ao Condomínio, como adquirente dos bens levados ao leilão final, parecendo autorizar a conclusão de que o condomínio seria pessoa jurídica (titular de direitos e obrigações).
 
   "Essa interpretação, porém, entra em conflito aberto com o sistema da Lei 4591/64, notadamente seus arts. 1º e 2º (que se referem às unidades autônomas constituindo propriedade exclusiva de cada condômino), o art. 9º (que alude à aquisição de unidades autônomas), o art. 12 (que menciona o condômino como obrigado ao pagamento das despesas), o art. 19 (que trata de direitos do condomínio) etc.
 
   "Em verdade, ao dispor que o condomínio terá preferência na aquisição dos bens não está a lei, 'ipso facto', conferindo-lhe personalidade jurídica, o que significaria flagrante contradição com o sistema que o próprio legislador elegeu.
 
   "A hipótese contemplada pela lei (cit. art. 63, § 3º) é especial e, só por isso, para atender a razões de conveniência ou praticidade, é que se aludiu ao condomínio como se fosse pessoa jurídica.
 
   "Em síntese, o só fato de a lei permitir a aquisição de bens pelo condomínio não confere a este os atributos de pessoa jurídica".
 
   Nesse aspecto, o atual Código Civil não inovou. Subsiste previsão legal apenas quanto à capacidade de agir o condomínio em juízo e de administração, concepções criadas para viabilizar a tutela e a gestão dos interesses comuns dos condôminos, mas que não lhe atribuem personificação.
 
   Não obstante, destaca-se a norma excepcional insculpida no parágrafo 3º do artigo 63 da Lei nº 4.591/64, a qual possibilita a aquisição de imóvel pelo condomínio ante a inadimplência do condômino. Mas tal não implica, como visto, reconhecimento de personalidade jurídica. Justamente por se tratar de exceção, concebida em função da natureza do débito enfocado, é que foi expressamente regulamentada.
 
   Alega o apelante, todavia, que a previsão contida no aludido dispositivo legal não se estende à hipótese presente.
 
   Tal modo de ver não se sustenta, visto que se cuida de situações manifestamente análogas, geradas pelo inadimplemento de um condômino em prejuízo dos demais, de modo que, a toda evidência, estão a reclamar igual solução.
 
   "Ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositio."
 
   Com efeito, não se justifica frustrar, na prática, como pode ocorrer em diversos casos, a cobrança, pelo condomínio, de despesas destinadas à sua própria manutenção, ao impedi-lo de arrematar ou adjudicar imóvel penhorado por dívida do condômino, quando o ordenamento vigente já contempla solução diversa, perfeitamente aplicável à espécie.
 
   No dizer de Ferrara, citado pelo saudoso Limongi França (Elementos de Hermenêutica e Aplicação do Direito, Saraiva, São Paulo, 1984, pág. 63), "os fatos de igual natureza devem possuir igual regulamentação, e, se um destes fatos encontra já no sistema a sua disciplina, esta constitui o tipo de onde promana a disciplina jurídica geral que deve governar os casos afins".
 
   Também nesse sentido se posiciona Carlos Maximiliano, aduzindo que semelhante raciocínio se funda "no princípio de verdadeira justiça, de igualdade jurídica, o qual exige que as espécies semelhantes sejam reguladas por normas semelhantes" (Hermenêutica e Aplicação do Direito, 11ª ed., Forense, Rio de Janeiro, 1990, pág. 210).   
 
   Bem por isso, visando dar solução mais sensata à questão em mira nos presentes autos, a jurisprudência tem admitido a aquisição de imóvel pelo condomínio em praça pública, independentemente de se lhe atribuir personalidade jurídica, a qual, deveras, não possui.
 
   Nesse sentido, merecem transcrição, v. g., os seguintes julgados do Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo que cuidam da matéria:
 
   "Se a Lei 4.591 concede ao condomínio a adjudicação de unidade leiloada, não pode o aplicador recusar esta aquisição, sob fundamento de que o condomínio não tem personalidade jurídica. O julgador deve aplicar a lei como está redigida e, se é a lei que concede a adjudicação, bom será o entendimento que permita a sua aplicação. E, ao 'contrário sensu', má aquela que vai dar na sua inaplicabilidade" ( AI 718.337-00/1 - 12ª Câm. - Rel. Juiz Ribeiro Silva - J. 21.2.2002).
 
  "Tem-se que a própria Lei nº 4.591/64 cuidou de dirimir a controvérsia referente à possibilidade do condomínio obter a adjudicação do imóvel em seu favor, ainda que não possuindo personalidade jurídica para figurar como titular de direito real. Conquanto não seja o condomínio dotado de personalidade jurídica, não se pode negar vigência ao dispositivo legal que traz hipótese expressa de exceção à regra (artigo 63, § 3º, da Lei 4.591/64)" (AI 747.349-00/9 - 8ª Câm. - Rel. Juiz Rocha de Souza - J. 8.8.2002).
 
   Dessa forma, a arrematação ou adjudicação, com ingresso no fólio real, deve ser deferida ao condomínio na hipótese acima referida, ou seja, como forma de satisfazer o crédito decorrente do não pagamento, pelo condômino, das despesas condominiais.
 
   Mister se faz ter em mente, contudo, que a aquisição da propriedade gera não só direitos, mas também obrigações. E, precisamente por não ser o condomínio, em que pese a conjugação dos interesses dos titulares, um ente imaterial com personalidade jurídica própria, é necessária, para que possível a arrematação ou adjudicação, a anuência dos condôminos, por decisão unânime de assembléia geral, na qual, para essa finalidade específica, obviamente não terá voto o proprietário da unidade autônoma que gerou as despesas condominiais objeto da execução em que arrematada ou adjudicada tal unidade. Eis o que dimana, respeitada a mesma simetria, do aludido parágrafo 3º do artigo 63 da Lei nº 4.591/64.
 
   Observe-se, inclusive, que, por idêntica motivação, a posterior alienação da mesma unidade autônoma pelo condomínio dependerá, igualmente, da concordância dos condôminos em assembléia geral.
 
   Essas cautelas se impõem porque, em casos semelhantes, o bem, apesar de arrematado ou adjudicado pelo condomínio, será, em última análise, de propriedade conjunta de todos os condôminos, os quais não podem ser constrangidos a adquirir coisa imóvel, fonte, como dito, de deveres e obrigações. E também não podem, salvo nas hipóteses legais, ser constrangidos a alienar imóvel de que são co-proprietários.
 
   Na situação concreta ora analisada, aliás, a necessidade de deliberação em assembléia foi reconhecida e consignada no item IV da ata de fls. 16/18, onde consta que, aventada a possibilidade de aquisição de "unidade inadimplente" em hasta pública, foi esclarecido que "tal procedimento deve ser colocado em votação na assembléia, desde que respeitados os dispostos na Convenção de Condomínio que estabelece quórum específico para apreciação do assunto cuja presença exigida é da totalidade dos proprietários" (sic - fls. 17).
 
   Não há, entretanto, demonstração de que essa assembléia se realizou, nem, conseqüentemente, de que a aquisição ora em tela foi aprovada. Uma vez que a arrematação já se operou, mostra-se admissível, em tese, o registro da respectiva carta, desde que tomada referida providência, ainda que seja ela posterior à aquisição mencionada.
 
   Mas, nada juntado aos presentes autos para evidenciar sua concretização, inviável se mostra permitir, aqui, que o título seja registrado, anotando-se que ficará o impedimento afastado caso devidamente comprovada a anuência dos condôminos.
 
   Apenas por isso, dou provimento ao recurso, para julgar procedente a dúvida.
  
   (a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
 


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