Despachos/Pareceres/Decisões
19162/2004
:
ACÓRDÃO _ DJ 191-6/2
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 191-6/2, da Comarca de GUARUJÁ, em que é apelante ANGELO FRANCHINI NETO e apelado o 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 16 de setembro de 2004.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS - Aforamento de imóvel da União - Instrumento particular de compromisso de venda e compra - Acesso negado - Imprescindibilidade de apresentação de certidão da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e de comprovante de recolhimento do laudêmio - Dúvida procedente - Inteligência do artigo 3º, § 2º, do Dec. -lei nº 2.398/87, com a redação dada pelo artigo 33 da Lei nº 9.636/98 - Recurso não provido.
1. Cuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Guarujá, o qual negou o registro de instrumento particular de promessa de venda e compra referente a imóvel da União objeto de aforamento a particular, fundamentando a recusa na ausência de certidão expedida pela Secretaria do Patrimônio da União - SPU e de comprovante de recolhimento do laudêmio.
Alega o apelante, pleiteando a reforma da decisão, que as exigências são infundadas, pois o compromisso de venda e compra não implica transferência do domínio, única hipótese em que se justificariam.
Os órgãos do Ministério Público de primeiro e segundo graus entenderam que o recurso não merece provimento.
É o relatório.
2. A questão não é nova e este Conselho já firmou posição a respeito.
Revelam-no os precedentes coligidos pelo "Parquet" (Apelações Cíveis nºs. 76.285-0, 69.726-0/8, 49.720-0/0, 58.835-0/0 e 54.503-0/6), que transcreveu ementas e trechos elucidativos (fls. 104, 122 e 128/129), os quais, por já se encontrarem nos autos, é despiciendo reproduzir novamente.
Cumpre destacar que a interpretação que o apelante busca atribuir ao dispositivo de regência padece de manifesto equívoco e não pode prosperar.
Deveras, o parágrafo 2º do artigo 3º do Decreto-lei nº 2.398/87, com a redação que lhe conferiu o artigo 33 da Lei nº 9.636/98, contém disposição genérica, que abrange qualquer instrumento negocial concernente a imóveis agrilhoados à União.
Estabelece os requisitos a serem observados para o registro de "escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União, ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio", impondo a exibição da ora exigida certidão da SPU.
A mera referência a "escrituras", como se percebe, não se restringe, por ausência de qualquer especificação, a instrumentos públicos, nem àqueles que possibilitem efetiva transferência do domínio útil. Não é demais lembrar, aliás, que nenhuma escritura propicia, por si só, tal transferência, que depende do ulterior registro.
O fato de se prever que constará da certidão em tela autorização da Secretaria do Patrimônio da União para a transferência do imóvel não significa, necessariamente, que será desde logo transferido. Trata-se de exigência destinada a demonstrar que o negócio foi regularmente comunicado ao órgão administrativo competente e que este conferiu o atendimento das formalidades legalmente estabelecidas acerca da hipótese.
Vale notar que a demonstração do recolhimento do laudêmio também quando se cogitar de compromisso de venda e compra é imperativa a fim de inibir qualquer tentativa de contornar a lei para escapar ao pagamento. Entendimento diverso possibilitaria o registro, em cadeia, de instrumentos particulares dessa natureza sem que, relativamente a cada operação, houvesse o regular adimplemento. Criar-se-ia uma continuidade informal, rumo ao infinito, privando a União das verbas devidas.
Lembre-se, ademais, que tão relevante se mostra hodiernamente o compromisso de venda e compra, que o novel Código Civil expressamente consignou no rol dos direitos reais o conferido ao promitente comprador do imóvel (artigo 1.225, VII).
Mas, voltando, para arrematar, ao parágrafo 2º do artigo 3º do Decreto-lei nº 2.398/87, com a redação dada pelo artigo 33 da Lei nº 9.636/98, cumpre ter sempre presente que o texto legal, como já sublinhado, menciona "escrituras" sem qualquer distinção, especificação, restrição ou limitação. Irrelevante, pois, o fato de se consubstanciar o escrito em instrumento particular de compromisso. Como cediço em hermenêutica, ao intérprete não é dado distinguir onde a própria lei não distingue.
"Ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemos". Eis o brocardo consagrado.
Correta, enfim, a recusa do oficial, tem-se que a r. sentença não comporta reparo.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
|