Despachos/Pareceres/Decisões
23763/2005
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ACÓRDÃO _ DJ 237-6/3
: 26/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 237-6/3, da Comarca da CAPITAL, em que são apelantes ADAIL TOSTES e HERMELINDA PEREIRA TOSTES e apelado o 11º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores LUIZ TÂMBARA, Presidente do Tribunal de Justiça e MOHAMED AMARO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 31 de janeiro de 2005.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida inversa - Escritura de venda e compra acompanhada de escritura de retificação, ratificação e aditamento - Parcelamento irregular do solo - Fração ideal localizada - Acesso negado por sentença - Apelação - Existência nos autos de mera xerocópia da escritura retificadora - Matéria prejudicial - Inteligência, ademais, da determinação normativa da E. Corregedoria Geral da Justiça (Proc. CG 2.588/00) - Recurso não provido.
1. Cuida-se de apelação interposta por Adail Tostes e sua mulher Hermelinda Pereira Tostes contra sentença, proferida em dúvida inversa, que manteve a recusa do 11º Oficial de Registro de Imóveis da Capital e indeferiu o registro de escritura de venda e compra, acompanhada de escritura de retificação, ratificação e aditamento, com base na configuração de parcelamento irregular do solo urbano.
Sustentam os apelantes que o registro é imperativo, como corolário do direito de propriedade. Além disso, a aquisição é anterior à Lei nº 6.766/79 e, assim, suas disposições não incidem. Por outro prisma, treze outros adquirentes na mesma situação conseguiram registros, de modo que os recorrentes merecem igual tratamento. Requerem, pois, provimento, para reforma da sentença.
Proferiu parecer o órgão de segundo grau do Ministério Público, pronunciando-se pelo não conhecimento do apelo, uma vez que não juntado o título original, e requerendo, ainda, que, se conhecido, não seja provido, mantendo-se a decisão pelos fundamentos nela enunciados.
É o relatório.
2. Embora venha sendo admitido o processamento da chamada dúvida inversa, suscitada diretamente pelo interessado, no presente caso concreto não se acha preenchido requisito essencial e indispensável para que a pretensão possa, sequer, ser conhecida como tal.
Verifica-se, com efeito, que os apelantes, como se dessume da inicial, almejam o registro de escritura "de compra e venda datada de 08 de outubro de 1999 e escritura de retificação, ratificação e aditamento (docs. 3 e 4) em anexo" (fls. 02). No entanto, a estes autos não foi trazido o original desta última, como seria de rigor, constando de fls. 14/14vº simples xerocópia.
Contrariada, pois, a norma do artigo 198 da Lei nº 6.015/73, no qual se exige que, na hipótese de dúvida, "o título" que se quer registrar seja "remetido ao juízo competente".
Inarredável essa premissa, pois da análise direta do próprio título, inclusive no tocante a sua autenticidade, regularidade formal e conteúdo, análise essa logicamente precedente ao próprio exame das questões de direito debatidas, depende a aferição de sua admissibilidade, ou não, no âmbito do fólio real.
Acerca de hipóteses quejandas este Conselho tem posição firmada, da qual é representativo o V. Acórdão proferido na Apelação Cível nº 43.728-0/7, da Comarca de Batatais, publicado D.O.E., Poder Judiciário, Caderno I, Parte I, de 13 de outubro de 1998, página 04, e relatado pelo eminente Des. Sérgio Augusto Nigro Conceição. Eis sua ementa:
"REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida inversamente suscitada - Falta do título original e de prenotação - Inadmissibilidade - Prejudicialidade - Recurso não conhecido".
O texto do julgado, no qual há referência a outro precedente, é categórico:
"Pacífica a jurisprudência deste Colendo Conselho Superior da Magistratura no sentido da necessidade de apresentação do título original, como decidido na apelação cível n.º 30.728-0/7, da Comarca de Ribeirão Preto, Relator o Desembargador Márcio Martins Bonilha, nos seguintes termos: 'Ora, sem a apresentação do título original, não admite a discussão do quanto mais se venha a deduzir nos autos, porque o registro, em hipótese alguma, poderá ser autorizado, nos termos do artigo 203, II, da Lei 6.015/73'".
Cumpre frisar, pois, que a ausência do requisito supra mencionado fulmina a apelação interposta, deixando-a prejudicada, assim como a própria dúvida inversa.
Vale assinalar, todavia, que, mesmo no tocante à matéria de fundo, se pudesse ser abstraída a questão prejudicial, não haveria sucesso possível para os recorrentes.
Eles próprios admitem que se estabeleceu, naquela gleba, situação esdrúxula, ao arrepio das normas legais de parcelamento, uma vez que, apesar de se tratar de vendas de frações ideais de um único imóvel matriculado, são apontadas como correspondentes a metragens certas (cf. fls. 17/21) e "13 outros compradores levaram a registro e obtiveram total êxito quanto ao registro das áreas adquiridas do mesmo vendedor" (fls. 03).
Infere-se que, apesar da divisão em meras frações ideais, se procurou, na prática, demarcá-las, vendidas que foram a pessoas sem vinculação entre si.
Daí o vislumbre, na r. sentença recorrida, de parcelamento irregular.
Portanto, para viabilizar o registro da venda de partes da área matriculada sob nº 218.582, é de rigor que, em primeiro lugar, se regularize o estado de ali coisas existente, inserindo-o no molde legal. Isto sob pena de se perpetuar a irregularidade instalada.
Eis o já decidido nos autos da Apelação Cível nº 41.855-0/1, da Comarca de Jaú, em que figurou como relator o ínclito Des. Sérgio Augusto Nigro Conceição, conforme publicado no D.O.E.- P. J. de 27 de março de 1998:
"Não socorre o recorrente o fato de ter obtido anteriormente o registro de outras partes ideais relativas à mesma matrícula, sendo pacífica a jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior da Magistratura ... no sentido de que erros pretéritos do registro não autorizam novos e reiterados erros, dada a inexistência de direito adquirido ao engano, como expresso no v. acórdão que decidiu a apelação cível n.º 28.280-0/1, da Comarca de São Carlos, Relator o Desembargador Antônio Carlos Alves Braga: 'Tranqüila a orientação do Conselho Superior da Magistratura no sentido de que erros pretéritos do registro não autorizam nova e repetida prática do ato registrário irregular, inexistindo direito adquirido ao engano (apelações n.ºs 14.094-0/5, 15.372-0/1, 13.616-0/1, 3.201-0, 5.146-0 e 6.838-0, entre outras)'".
O parecer proferido no processo CG nº 2.588/2000, sobre parcelamento irregular, reporta-se, expressamente, a tal decisão:
"Verifica-se, portanto, que após a publicação do aresto acima mencionado já não se pode aceitar como regular a efetivação, por registrador de imóveis do Estado de São Paulo, de registros referentes a imóveis que se encontrem em situação similar, o que se mostra suficiente para estancar, de pronto, ao menos junto ao registro imobiliário, a continuidade de prática deletéria e que já contaminou um significativo número de matrículas, dispersas por todo o nosso Estado".
Na seqüência, em relação aos "imóveis já irregularmente parcelados", sublinha-se a "clareza com que a orientação administrativa atual impede o registro de novos títulos".
Em tais condições, enfim, percebe-se que, ao se recusar o registro, não se está a negar o direito de propriedade, mas a se zelar para que este, como é de rigor, seja exercido nos termos e nos limites da lei. No caso, a legislação referente a Registros Públicos e a parcelamento de solo.
Por outro lado, embora se alegue "que os apelantes adquiriram esse imóvel, dois (2) anos antes da edição da mencionada Lei 6.766/79" (fls. 52), o documento em que embasada tal assertiva é mero instrumento particular de compromisso de compra e venda não registrado, do qual foi juntada singela xerocópia (fls. 15/16vº). A escritura pública de venda e compra é de 08 de outubro de 1999 (fls. 12) e a escritura de retificação, ratificação e aditamento, também meramente xerocopiada, é de 30 de janeiro de 2003. Mas o fato é que só agora, após mais de vinte anos de vigência do diploma legal em apreço, os recorrentes buscam o registro, que é o meio pelo qual, à luz do ordenamento, efetivamente se adquire o domínio, havendo que se observar a disciplina em vigor.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
(a) JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE, Corregedor Geral da Justiça e Relator
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