Despachos/Pareceres/Decisões
5960/2003
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ACÓRDÃO _ DJ 59-6/0
: 25/03/2009
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 59-6/0, da Comarca de PENÁPOLIS, em que é apelante POLIZEL - COMÉRCIO DE GLEBAS RURAIS LTDA. e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da mesma Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores SERGIO AUGUSTO NIGRO CONCEIÇÃO, Presidente do Tribunal de Justiça, e LUÍS DE MACEDO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 23 de outubro de 2003.
(a) LUIZ TÂMBARA, Corregedor Geral da Justiça e Relator
V O T O
EMENTA: Registro de Imóveis - Dúvida julgada procedente - Pretendido registro de escritura pública de compra-e-venda - Alienação de partes ideais - Área de preservação ambiental permanente - Precedentes - Conjuntura caracterizadora de fraude à lei - Registro inviável - Recurso desprovido.
Cuida-se de recurso de apelação tempestivamente interposto por Polizel Comércio de Glebas Rurais Ltda. contra r. decisão prolatada pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Civil de Pessoa Jurídica e Títulos e Documentos da Comarca de Penápolis, que julgou procedente dúvida inversamente suscitada e manteve a recusa ao registro de escritura pública de venda-e-compra, lavrada nas notas do 2º Tabelião local (fls.18/19) e datada de 27 de março de 2001, onde constam, como outorgante, a apelante e, como outorgados, Francisco Carlos Jorge Colnaghi, José Roberto Colnaghi, Antonio Reyes Sakr, Luiz Henrique de Felippe Valente, Maria Amélia de Felippe Valente e Sérgio Burzichelli, relativa a uma gleba a ser desmembrada do imóvel matriculado sob o número 29.633 do ofício predial referido, correspondente a parcela da "Fazenda Ajai", localizada no Município de Penápolis.
A decisão atacada fundou-se na identificação concreta de potencial desrespeito à legislação atinente ao parcelamento do solo, postulada, sob a roupagem do condomínio tradicional, a transferência de lotes já definidos e ajustados (fls.151/153).
A apelante argumenta que a gleba em relevo se encontra em área de preservação permanente, totalmente reflorestada, proibida a inserção de qualquer edificação, sendo colhida a aprovação de todos os órgãos administrativos. A alienação efetivada, de acordo com o expendido, preenche todos os requisitos legais, sendo regular e, por isso, o registro postulado merece ser realizado. Pede a reforma do "decisum" (fls.157/166).
O Ministério Público, em segunda instância, opinou seja negado provimento ao recurso (fls.177/181).
É o relatório.
O apelo merece improvimento.
Pretende-se efetivar, a partir da Matrícula 29.633 do Registro de Imóveis da Comarca de Penápolis, desmembramento, consumando o surgimento de um novo imóvel, a ser mantido sob o regime de condomínio tradicional.
Dito imóvel apresenta área superficial total de 22.664 m2 (vinte e dois mil, seiscentos e sessenta e quatro metros quadrados), tendo sido atribuídas partes ideais diferenciadas aos outorgantes-compradores. Conforme o constante a fls.19, a Francisco Carlos Jorge Conalghi e José Roberto Conalghi, em conjunto, é atribuída uma parte ideal correspondente a 76,42% (setenta e seis por cento e quarenta e dois centésimos), enquanto 7,86% (sete por cento e oitenta e seis centésimos) são atribuídos a Antonio Reyes Sakr e Sérgio Burzichelli, bem como, em conjunto, a Luiz Henrique de Felippe Valente e Maria Amélia de Felippe Valente.
A apelante afirma que a alienação visa possibilitar, pura e simplesmente, o acesso dos adquirentes a uma represa limítrofe, o reservatório da Usina Hidroelétrica de Nova Avanhandava, mas, como o lembrado pelo órgão ministerial (fls.180/181), a gleba alienada é, também, vizinha à área de um loteamento aprovado ("Recanto Belvedere"), composto por duzentas e oitenta e quatro novas unidades imobiliárias e de cujo projeto não constava tal acesso. Nesse sentido, a conjuntura apresentada denota pretenda-se mascarar, perante os órgãos da Administração encarregados da tutela do meio ambiente, a efetiva vinculação da área em apreço ao mencionado parcelamento, afastando a possibilidade de serem feitas objeções e exigências adicionais.
Soma-se, ainda, o fato de terem sido atribuídas proporções dispares aos adquirentes e de haver a apelante sido celebrado, no ano de 1999, quando do registro do antecedente loteamento, termo de compromisso de recuperação ambiental (fls.68/69).
Diante dos elementos coligidos, é possível, assim, afirmar a presença de indícios graves de que o imóvel enfocado está sendo parcelado ao arrepio das regras de ordem pública, que regem a atividade relativa ao parcelamento do solo e a proteção ao meio ambiente, evidenciando uma situação de fraude à lei.
Em consonância com o proposto quando do julgamento da Apelação Cível nº 72.365.0/7-00, da Comarca de Atibaia, por este Conselho Superior, se vislumbra "a utilização de expediente aparentemente lícito, qual seja o condomínio tradicional, previsto no Código Civil, com a alienação de partes ideais não localizadas e sem identificação no título, para burla da legislação cogente que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, viabilizando, por meio de fraude, se não a implantação de loteamento irregular, ao menos a efetivação do desmembramento (...)". Torna-se inviável o registro.
A argumentação formulada pelos apresentantes do título, por outro lado, não se sustenta. Se, por um lado, a recusa está lastreada na interpretação sistemática das normas atinentes ao parcelamento, a disposição sobre os direitos de propriedade, por outro lado, há de respeitar sua função social e encontra limites.
Na espécie, portanto, o óbice oposto restou concretizado, restando lastreado na finalidade de garantir o interesse público.
Isto posto, nego provimento ao apelo.
(a) LUIZ TÂMBARA, Relator
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